domingo, 20 de dezembro de 2009

um domingo

estou bebendo desde ontem, oito e meia da noite. já se foram coquetéis de morango, lágrimas, filmes, e agora uma garrafa de vinho chileno à espera no congelador.

em um ano, troquei um apartamento por uma casa, casei, virei mãe, abandonei dois empregos e comecei a viver exclusivamente de cinema. de estagiária a assistente de direção. abandonei a três por quatro a faculdade, em alguma birosca suja da esquina. mas consegui terminar o penúltimo semestre com louvor - imagine. minhas dúvidas até cessaram. mas eis que estão de volta. são sempre benvindas. e ainda que eu tenha mandando às favas o jornalismo, feito o curta, recebido prêmio, iniciado um segundo e começado um longa-metragem sobre o assunto que mais me fascina nessa pequena existência, ainda assim, imagino como deve ser a vida de uma diplomata. e se essa vida não poderia começar a ser minha.

em outubro, conheci a cidade que irá me abrigar próximo ano: londres.

parei com a prosa. me dediquei à poesia. nunca escrevi tanto. nunca mostrei a tão poucos. voltei a pintar e não mostrei a ninguém.

minha filha acabou de agarrar uma maçã. não consigo parar de olhar.

comprei um carro. para ser mais um poluente na terra. mais um estressado do trânsito. mais um no posto de gasolina. mais a um a fazer mochilão pela américa do sul de fusca.

assinei contratos. de casa, de emprego, de confidencialidade, de empréstimo.

em novembro, não engoli sapo. ele foi demitido. não doeu. achei que fosse.

não sei para onde vou; quero ir para longe, um lugar de muitos rios e sem esse som frenético de caminhões. costumava gostar das cidades e de suas inúmeras histórias, mas faz parte da minha nova índole contar apenas a minha.

mas não sei como começar;

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

para ele

Arnauld tem grandes olhos azuis
e um teto muito branco
para poder se confundir com as nuvens
os dias de Arnauld andam muito devagar
- ou muito rápido, a depender do sabor de quem olhe
pois o ontem já não anda mais por aqui
- arnauld é um astronauta
só o interessam planetas
foguetes
galáxias
hoje esse menino velho
esse explorador do passado
um sonhador incorrigível
acordou cedo para comprar leite.
quando chegou, viu que já tinha uma garrafa
pôs-se a gargalhar
descalço, como quem sabe tudo
mas nada fala
porque faz muito calor lá fora.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

haikai de dezembro

ah, eu quis demais.

por querer demais. o além.

restou-me demais. o querer.

não sei que fazer, já que não quero mais.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

você olha para mim e diz que está cansada e que eu devo entender, afinal, estamos aí, somos todos uns fardos, esse peso ninguém tira está aqui e... mas quanta merda. sinceramente, vindo de você. ainda por cima. o que você, minha senhora, precisa entender, é que derrubado esse muro, estuprada essa grade, implodida essa grandeza aristotélica de condescendência que você apresenta perante o mundo, nada restou. e o que fazemos com esse nada? você prefere mentir, abstrair, andar sobre a linha à noite como quem ainda não dormiu - nada vejo, nada sei, que milagre, que milagre lindo acontece sob meus olhos. pois não há milagre algum, estamos todos na navalha, o meu pé é uma navalha funda na sua garganta, pois diz que é apenas isso. sê! sê crua! sê crua uma vez na vida e tenha coragem de sair à janela pra ver a desgraça que é. fecharam-se todos os portões e estamos trancados aqui dentro, eternizados estamos a ficar juntos. e a minha senhora ainda vem me falar em destino! você é ridícula. é ridícula quando não percebe a linha aqui, à sua frente. depois dela, você não é nada. eu não sou nada. não existe nada.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

perguntei a janela
o que queria da rua
ela me disse para fugir
e não voltar nunca mais.
esqueci a chave de casa
pendurada na porta
os lençóis do quintal mancharam
veio a noite e dormi
abraçada ao tapete dos sonhos.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

do abajour

manuela acendeu a luz furiosamente. nunca imaginou que um advérbio - ainda mais esse, cheio de som - fosse caber para essa situação. mas foi. furiosamente. eduardo havia insistindo em comprar o abajour. porque iria combinar com a mesa ao lado da cama. não adiantava pingar, todos os dias, a conta de luz, o barulho do botão, as interrupções noturnas. sem luz, se é obrigado a dormir (quando não consegue dormir, manuela imagina uma gangue de traficantes invadindo a casa na madrugada; precisa fazer silêncio, muito silêncio, antes que percebam a dona irrequieta). mas agora eduardo possuía a maior das invenções humanas: o abajour. azul, ainda por cima. antes tivesse tido apagão. manuela virou-se de costas. andando sobre nuvens e tragédias, aliás. leu outro dia em um livro. de quem é essa frase? (pensaria melhor sem.) manuela não anda, desagüa. nuvens não agüentam; mas ainda se agüentassem, provocam muita luz em muitas formas. e manuela é uma só.

domingo, 22 de novembro de 2009

do medo

existe algo em relação ao medo. não é o amor que come sua identidade. é tudo muito bonito no papel, no palco, sob luzes e holofotes - mas identidade mesmo quem come é o contrarregra.

porque medo, veja bem, é regurgitar sonhos. assim, na metáfora barata porque somos todos muy muy baratos e habitamos en miami, chica. medo é a ana, a vizinha do 902, com quem você brincava de pega-ladrão, mas nunca conseguiu emitir nenhum som além de "peguei". daí que a ana tá hoje casada com um dentista, fez uma reforma de porcelana tem pouco tempo e você taí, vendo televisão do lado de alguém que nem sabe quem.

ter medo de ladrão é muito fácil, é esperado, é o rotineiro, café com bolo de cenoura. outra coisa é o carro furar no início da estrada, e o céu, negro e estrelado como nunca, engolir suas frases. a pé, em uma escuridão sem fim, e sem lugar pra ir - é uma estrada, não sabe?

não é o medo de receber rosas e ser uma bomba - é de receber as mesmas rosas e não ter a mínima idéia de quem as mandou, porque não há ninguém. o mais lógico, então, seria mesmo ser uma bomba. mas não é.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

ganhei máquina de lavar, dois puffs (um preto e outro azul), um ventilador para os dias áridos, uma capa azul céu, salpicada de branco, para o sofá, liqüidificador, ferro para clarear as idéias, uma piscina de plástico para se fazer de feliz e uma rede. vou pendurá-la naqueles dias bem luminosos.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

meu deus, chegou o natal. e 2010.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

é chegada a hora de dizer tchau a laranjeiras. so long, goodbye. foram 2 anos e 9 meses convivendo com seu antônio, o psicopata do prédio em frente, o vizinho jazzista e seu pai alcóolatra (o grande clichê do 302), o síndico e sua mulher que adorava quando ele viajava, os músicos do quinto andar, o adolescente espinhudo que em 60 meses não aprendeu a tocar gone to be wild, o entregador de jornal, de leite, de princesa, o italiano, o português, o vazio. laranjeiras à noite produz desespero em almas recém-rendidas. caleja-se um pouco, mas chega-se lá.

anteontem, estava dormindo e uns malucos na rua começaram a gritar. malditos. quis jogar o computador pela janela, mas desisti e só coloquei a cabeça. estavam espancando um homem, aparentemente, ladrão de velhinhas. ensagüentou-se ao lado da tenda de frutas.

acordei hoje, com o céu tão azul - poderia ser usado como chroma-key -, e o bafo do inverno carioca no cangote: as flores amarelas estavam espalhadas, agarradas ao asfalto. um tapete dourado de ilusões na rua das laranjeiras.

outro dia, creio na quinta-feira, dormi no ônibus. vinha de uma filmagem de dia inteiro, sol-chuva, praia, tempestade, segura tripé, não morre, não. apaguei. sonhei, até. o cobrador me acordou na porta de casa.

em laranjeiras não tem mercado, não tem padaria, não tem farmácia. o restaurante é italiano, o clube é judeu, a doceira é japonesa. o cineclube pertence a um senhor, amigo de anselmo duarte, que divide as estantes por diretores. duas amigas estilistas dividiam um ateliê na rua das laranjeiras; foram para a gávea, faliram. em muitas madrugadas, a tal rua foi minha companheira - andávamos de bicicleta, contávamos segredo, somente eu e ela.

eu volto. quando os preços do aluguéis forem mais baratos ou quando conseguir comprar aquela casa, no 550.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

sinto novos ventos vindo pela esquerda. devo descer a ladeira rumo ao mar.

acho que sim.

acho que é agora.

acho que vamos.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

determinadas coisas a gente não perdoa. nem deus perdoa. alice não esquece o tapa no rosto, de marca quente e pele fria, agarrada à parede, com desejo de matar. matar mesmo. a gente que vibra em filme do clint eastwood não entende desejo de matar, de pegar o garfo e enfiar na garganta até ver sangue.

daí alice correu, só de camisa, pela rua, e tava sol. um sol do caralho. chorou pra caralho também. enrolou as mãos no peito e se fez uma só, até esmiuçar tudo quanto era água dentro. depois recolheu o que ainda havia de dignidade e foi embora.

agora. você vem, diz alice, e me pede para superar? para esquecer? para passar por cima? alice anda dormindo pouco, muito pouco.

domingo, 25 de outubro de 2009

outra do mais do mesmo: não consigo passar muito tempo fazendo a mesma coisa, e começo a me perguntar se não estaria perdendo meu tempo fazendo essa atual. a segunda parte da tramóia é começar a pensar que, bem, já que estou pensando em explorar outros territórios, então talvez não seja exatamente capaz nessa minha área - e deva ir fazer alguma outra, como cantar, pintar, dirigir um circo ou trabalhar em um restaurante.

dessa sensação, de não pertencimento, de não encontramento, de não, não, não, nasce um choro bem amuado, um canto bem ali no quarto. não estou aqui, não estou lá, não estou com você, em nenhum lugar. essa estranha necessidade constante de mudança - para mais longe, mais longe, até a estrelas, mas vem comigo por favor - me coloca nesse trem-fantasma, partindo de uma estação que já se acaba na noite, distante e sem rumo, e o pior de tudo - vazio, com apenas uma passageira.

sábado, 24 de outubro de 2009

2nd day in london

saturday morning. toda uma cidade para descobrir.

acordei cedo, sem nem conseguir comer, e parti para portobello market, o tradicional mercado de TUDO que acontece aos sábados em notting hill. me disseram para não chegar cedo; desobedeci à norma e encontrei muitas lojas vazias. uma estava aberta, a de uma simpática go-go girl, colecionadora de caveiras e snoopys.

mimmi tem uns 25 anos, cabelo preto bem preto, unhas vermelho-carmim, sombra roxa e dois brincos de navios piratas. deixa mensagens bem-humoradas e atrevidas para os clientes: no espelho, "your hair is fine"; na prateleira de betty boop, "you can look like her, but she's better". levei um par de âncoras. mimmi me disse que eram os favoritos dela. usava uma blusa "if you don't love my city, fuck off".

portobello market é uma sensação, um instante marcado de um tempo. livros raros, que jamais você irá encontrar novamente - uma edição de alice no país do espelho de 1957, em que ainda há o cheiro de tinta -, estão lado a lado com jovens músicos e óculos coloridos, além de antigas máquinas fotográficas - a polaroid ainda existe, sim! - e muitos casacos sem dono. um dia, todas essas peles foram de alguém, mas agora... estão no cabide, por 10 pounds.

muitas antiguidades: anéis, passadeiras, penteadeiras, brincos. um quebra-cabeças de quem teria usado o quê, quando e onde - em uma festa, em um jantar, em um primeiro encontro com um namorado, escondida dos pais, em hyde park?

depois, camden town. cinza, poluída, caótica, com lambretas no lugar de bancos e um lago sujo. my favorite place in the whole world. se deus descesse do seu alto trono nos céus, veria que a babel funciona: franceses, espanhóis, argentinos, turcos, afegães, colombianos, indianos. e funciona. camden é uma versão punk do mercado de notting hill, com três setores principais: o market, o food place, e o lake. se você quer tapetes indianos, é lá. um graffiti artist/tatuador pintando uma camiseta/quadro, é lá. um francês e seu ajudante afegão para fazer um tour por londres à noite e ainda ganhar óculos de graça, é lá.

certas coisas não devem ser contadas: guardamos para não morrer quando do relato para outras.

a waterloo bridge, o london eye, o big ben, e especialmente, o st. james's park com pizza e estrelas à noite, são dessas. antes que se percam na próxima esquina, no próximo sussurro.

first day in london

(ao som de nada.)

a primeira visão de quem sai do heathrow airport é o subúrbio. as casas todas iguais, com aquela vermelhidão típica e as chaminés soltando fumaça. a temperatura está boa - não uso luvas, mas estou de botas e um casaco. é cedo. muitas, muitas pessoas lêem o jornal. alguns dormem.

em earl's court, muitas pessoas passando, de um lado para o outro. é um bairro residencial, perto de chelsea, charmosérrimo. árvores imensas a cada quarteirão. um starbucks. uma banca de jornal em frente ao metrô! eles vendem cigarros - que bom.

por muitos minutos, não acreditei. segui a earl's court road, virei na lillie road, cheguei ao hotel. abri a janela: londres. inteira, somente para mim.

voltei ao metrô, em direção a leicester square. quantas luzes, quantas pessoas, quantas lojas, quanto vento. eu vento, nós ventamos, eles ventam. entrei e saí de umas trinta lojas, pelo menos, entre livrarias, lojas de discos (sim, elas ainda existem! encontrei um cd raríssimo do velvet underground por 3 pounds), brechós (muitos, muitos, muitos), galerias de arte. em uma, o cara vendia reproduções de banksy como louco (que, aliás, estão em todo lugar). mostrei a ele a minha tatuagem - e ganhei um quadro. gentileza.

quando a noite caiu, eles saíram, aos montes. eu ali, mais achada que perdida, caminhando. feliz, de verdade, de poder sustentar essa felicidade e segurá-la com mãos, pés, boca.

na volta pra earl's court, parei em pub (levemente amaciada por um outro em leicester). seu dono se chamava stanford, e era australiano. o único garçom era jim, ator, belíssimo. símile de modelo italino - olhos fortes, nariz grande, queixo poderoso. stanford havia saído recentemente dos anos 70 e parou ali por mero acaso: cabelo loiro enorme, blusa do pink floyd, óculos de lennon. a família é da irlanda, e ele era o único filho a ficar na terra, ao lado do pai. depois, cansou. e veio para londres. morou com a irmã um tempo, e hoje está aí.

fazia muito frio. coloquei minhas luvas, acendi um cigarro. ainda havia tempo para uma última guiness no pub em frente ao hotel - mas as pessoas estavam com sono, queriam ir para casa, na tv estava passando futebol. fui embora para um sono tranqüilo. acordei com medo de ser sonho. não: estava em londres mesmo.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

(escrevo porque se contasse tudo que realmente sinto às pessoas, ou elas fugiriam ou pior, me silenciariam).

desenho ziguezagues
para me encontrar
nas esquinas áridas
das certezas
onde deixei meus sonhos
- quem sabe
vejo um amigo,
atravesso a rua.
mas ele não está. nunca esteve.

o mofo do rio de janeiro
me toma o ar
sobe à minha garganta

o que antes era era fértil
tão somente agora é
linha.

no quintal onde amanheceu
o ontem,
morreram todas as violetas.

restou pó.
restou sombra.
restou noite.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

já nasci adulta; aliás, torne-me adulta muito cedo. queria ser como essas pessoas leves, que olham pela janela e avistam árvores, um resquício de nuvem, a vizinha chegando com maçãs frescas nas compras. meu olhar vê o sinal vermelho, o homem varrendo a rua, as flores amarelas que deitam sobre o asfalto.

minha esperança consiste em tornar-me criança à medida que os anos passem; esquecer as responsabilidades, aposentar os cintos de segurança, abrir os braços. sentir o vento.
A pior parte dessa obrigação de sair de casa todos os dias e encarar o mundo é tolerar essas expectativas. Os outros, os outros, os outros - sempre maiores, melhores, azuis, que não bebem da água suja, não molham os sapatos na lama, e esperam que faça o mesmo.

angry birds fly away
join the rain
those dirty filthy streets
covered with lame.
i put on my black coat
and
tried to avoid the pain
though your silly little words
never escaped me.

deve existir algo maior - muito maior que isso. não é a simplicidade que me irrita, é a falta de opções.

domingo, 4 de outubro de 2009

hoje eu acordei tendo que fazer mercado. falta pasta de dente, aabonete e eu ainda prometi que iria arrumar a casa. há certo sentimento de libertação em recolher os papéis jogados no chão - mas da mesma forma, é uma grande responsabilidade escolher o que fica e o que vai. guardo muitas coisas - até as banais, como ingressos de cinema, ofertas de agências de viagem para bem longe, muito longe. estava com vontade de apenas deixar a preguiçar invadir, sem vergonha mesmo, e largar os compromissos para depois. mas há tempo? há tempo para depois? é tudo milimetricamente tão organizado, distribuído, embalado. hoje é domingo e as nuvens batem à minha janela, aqui em laranjeiras. daí que vou sair, sim. com a lista na mão e a caneta ao lado. tentar ser mais uma na multidão.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

entendi: nesses dias, me sinto um pássaro perdido.
há noites em que chego em casa cansada dos livros, do trabalho, do gato, das contas e me sinto vazia, mas tão vazia que sequer um alfinete encontraria abrigo. tanta coisa por fazer, tanto tempo a não perder - sem rumo, sem sentido, sem motivo.

esse pequeno apartamento parece grande demais e minhas dúvidas tomam conta - dúvidas, dúvidas, sou toda dúvidas. certezas, não há. os outros, sim; eles. eu, não.

todos têm tantas certezas. aqui dentro, reinam nuvens.

sábado, 26 de setembro de 2009

o homem mais bonito do mundo tem alguns fios brancos que cortam sua testa negra, perceptíveis apenas quando o olho consegue correr das janelas verdes. ele fala com toda a calma do mundo, de quem já correu mundo mas ainda tem terra nos all star azuis. o mais encantador pensa, pensa muito; fala com aquela preguiça de quem sabe que tudo de importante já foi falado, e nos resta agora, somente, esperar o tempo passar. o homem mais charmoso caminha, caminha adelante, sempre; com a única preocupação de passar desapercebido por essa multidão.

o homem, esse, repara
guarda segredos
e trafega pela corda-bamba
com a experiência
de um leão
- enjaulado pelas grades verdes.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

escrevo para me sentir menos sozinha. quáquáraquáquá: a vida dos meus personagens é muito mais inebriante que a minha, acabo que descarrego costumes, nomes, espaços, décadas, para depois me revirar na cama com minha crônica noturna.

não desistirei de escrever, jamais. esgrimarei todos os meus atores. é preciso, no entanto, esgrimar a solidão - porque essa não vai embora jamais, e é preciso aceitar. (ao lado de uma taça de vinho pinot noir. )

domingo, 20 de setembro de 2009

dois aspectos de "o globo" me incomodam; primeiro, a dita imparcialidade que eles propagam aos quatro ventos, como se fossem os detentores e propagadores de uma verdade universal e libertadora. o segundo, a postura de Estado, e que vem agora com essa campanha "nós e você já são dois gritando". o resumo: já que o Estado não se preocupa com os cidadãos, nós, do Globo, vamos resolver todos os problemas da sociedade. essa linha de campanha é desenvolvida, pelo menos, desde 2007, quando cheguei ao Rio de Janeiro - a idéia de que um governo omisso é facilmente substituível por um órgão de comunicação, com o slogan "além do papel de um jornal".

NÃO É.

"o globo" é uma empresa, e empresas não são poder público. empresas defendem os seus próprios interesses - no caso das organizações roberto marinho, reforma agrária, direito ao aborto, questionamento das forças militares brasileiras não são pautas viáveis. não são assuntos em discussão. um jornal depende dos seus anunciantes: "o globo" defende uma discussão sobre a sustentabilidade do meio-ambiente e toda quarta-feira coloca mais de vinte páginas por exemplar com os carros mais turbinados do planeta. faz-me rir.

no brasil, imprensa e estado estão promiscuamente ligados; pela inexistência de uma revolução burguesa no país, a revolução industrial foi empurrada pelo gargalo através do estado - quase sempre por governos ditatoriais. por falta desse processo histórico, roberto da matta diz que nós entramos na pós-modernidade em um outro modelo político-econômico. nem pior nem melhor - diferente. um modelo brazuca que coloca no mesmo balaio de gato estado, poder e comunicação.

não, eu não quero que "o globo" resolva minha vida - desejo que continue sendo o que é, uma empresa de comunicação. um jornal. não há nada além disso.

dificulta muito a tarefa a falta de opositores. com a decadência do jornal do brasil, quem mais fala nessa cidade? surge uma voz ingloriosa, a record, mix de grana, religião e apresentadores populistas. tenha medo daqueles que condicionam a comunicação à fé.

já vimos esses exemplos de massa inebriada antes.

resumindo: não, "o globo", eu não vou gritar com você.

e tenho ainda mais medo do que está por vir.

sábado, 19 de setembro de 2009

(meu maior medo é que descubram a grande farsa que eu sou.)

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

das lembranças mais antigas da minha mãe, o dia da morte de getúlio vem em primeiríssimo lugar. dona carmelita, minha avó, chorava copiosamente ao lado do rádio. vestiu ane, minha mãe, com uma seda azul e um laçarote branco; rumaram à casa da minha tia-avó, e a família ouviu reunida os pormenores do enterro de seu getúlio.

hoje em dia minha mãe nem sabe mais ligar o rádio. acostumou-se à televisão.

eu cresci agarrada às barras da saia do rádio da minha avó. minhas noites de insônia eram resolvidas ao som de cartas de amor, conselhos, ironias e uma voz solitária. ia dormir apenas quando ele se despedia - sentia pena de deixá-lo falando sozinho. falta de educação.

hoje, meu rádio nem antena tem. minhas madrugadas são profundamente silenciosas. organizo minha lista musical, ando sempre com um livro ou leio o jornal. sinto falta do rádio - meu amigo nunca foi um serviço de informações, mas apenas isso, um amigo.

domingo, 6 de setembro de 2009

- mas quando eu quis te falar de sonhos, você deu para trás; quando eu fui me meter a versar sobre nuvens, você zombou das minhas rimas, e agora que eu desisti você vem querer me ensinar?

sonhos

depois que acordei, trê estranhos sonhos ficaram na minha memória.

o primeiro contava a história de uma professora-cientista (eu), durante a revolução industrial, que descobria serem os alunos o material para a fornalha da fábrica. eu trabalhava no 5o andar, e eles eram enjaulados no 3o. o forno era no subsolo. o meu plano foi subornar o ascensorista - um senhor entre morgan freeman e o típico velho creepy dos contos-de-fada - para que ele nos levasse até o 2o andar, onde havia uma saída para a cidade. lembro de ter, pela primeira vez em muitos anos, visto a cidade através do elevador e achado tudo aquilo nojento. certo que minutos depois, a infataria da fábrica-matadora-de-criancinhas saiu para me caçar. com o BOPE. e do nada, surgiu um tiroteio entre infantaria-BOPE-traficantes.

(essa última parte vem do tiroteio ao lado de casa que ouvi ontem).

fim.

sonho 2.

estava em salvador novamente e não conseguia sair. meu carro era roubado. minhas roupas desapareciam. existia um espelho que narrava o futuro - mas eu não conseguia guardar o que ele dizia. tinha que voltar a cada minuto. via as placas de saída e não conseguia achar o caminho certo. havia um viaduto. perdi todos os dentes da fila de cima.

sonho 3.

estudava numa faculdade à la EUA, onde todos moram nos campi e são amigos-forever-and-ever. era a última semana. algumas brigas ali, outras lavagens-de-roupa, e muitos abraços e choros e cartas. houve muito mais, é claro, mas não consigo me lembrar dos detalhes. sei que acordei com uma sensação angustiante de tristeza, tempo que passou, vida que não fui.

saudade, essa palavra que nunca vai embora.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

estou em uma fase de filmes e peças. ando querendo entrar em cada teatro que é uma coisa. estranho, eu sempre fui rata de cinema, e estou acostumada a ter bilheteria aberta a qualquer hora do dia. teatro possui todo um ritual. é mais calmo. a venda de ingressos vai de terça a sexta, e a grande parte só abre depois do almoço. preciso sair do trabalho, correr lá, comprar o ingresso e voltar. ainda tenho agonia com teatro: são pessoas vivas, embaladas por uma emoção de outras pessoas vivas (nós, o público). e se eu rir na hora errada? se eu chorar, será que o ator vai me achar muito patética? e se eu quiser ir embora? não sei conviver com gente. ainda mais gente em um palco.

como não há mais estante na minha casa (o gato quebrou), comprei oito prateleiras negras e fuzilei a parede. agora os livros estão suspensos, pendurados, alçados ao céu. para pegá-los, preciso de uma escada. resultado? desisto de ler os antigos e compro novos.

(quero correr mundo desenhando rabiscos não no céu, mas no chão com aquele cheiro de chuva.)

não desista, meu amor, a vida ainda vai te surpreender para bem. ela é uma safada, dá tapa em luva de pelica, beijo com gosto de arsênico. mas não desista. eu seguro sua mão.

é iniciada a era em que qualquer um, a qualquer momento, pode ser ridicularizado por todos, em todos os momentos. que pena. a humanidade não irá pra frente, ela vive nesse pendoar de ir e voltar. regredir, avançar.

ciclos viciosos - mas quem não têm os seus?

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

na sexta, no sábado e hoje. dias bonitos pra caralho no rio. é tão estranho isso. acordei, peguei o jornal na porta de casa, li e reli, estirei as pernas, o lou deitou na minha barriga. os sonhos ficaram para amanhã, depois, quem sabe; depois de vinte e um anos de angústia, precisava me acalmar. sem sair de casa. falando pouco com os amigos. tempo de reclusão mesmo. mas nada de triste, não se preocupe, sou apenas eu e meus gatos.

sensação estranha essa, de felicidade, de tudo no lugar; a gente tão acostumada com a insuficiência, quando abre os olhos para a completude parece que há uma peça estranha no quebra-cabeça.

não tenho planos para o reveillon, não faço idéia de onde estarei no natal, abandonei completamente o jornalismo e em um domingo de sol procuro passagens para buenos aires no carnaval. estão baratas, inclusive.

gosto de dançar com você, e cada vez mais. quando nos conhecemos, éramos um twist-salto-duplo no infinito: enfurecidos, de casacos de couro, na lambreta velha de papai. passamos por uma onda new wave e até uma fase gótica (ou punk, como preferir). estamos hoje bem bailando valsa, e não há necessidade de banda nem orquestra - com assobios leves, marcamos o compasso na mão e tchá, um pra lá, tchátchá, dois pra cá.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

(a vida é cheia de som e fúria)

raios, trovões
um engarrafamento de pensamentos
na marquês de são vicente
a manhã chuvosa manchou o
espelho de águas-claras
dormente de desejo
- não imaginava ser acordado tão cedo
a senhora hoje me serviu pingado,
quando pedi amargo
e mal reparei nas flores amarelas
de laranjeiras
pois o mar acordou raivoso
semeando furacões
com o sorriso do moço
espumado à areia.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Se nada mais der certo

Não sei e nem me atrevo a definir o que é arte. Sei do que sinto e sei quando bate - quando machuca, quando trava a língua e quando arde. Na teoria, fazer um filme deveria reunir todas as seis grandes artes; é a única forma, para mim, capaz de juntar pintura, literatura, teatro, música, e ainda assim dar certo (quando dá). E no caso de Se nada mais der certo, do Belmonte, dá até demais. Dá certo até de faltar o ar.

A trama é simples: um jornalista cheio de ideais mas desempregado, que sustenta - mais que isso, ele é a força que faz essa mulher viver - uma anoréxica junkie e seu filho, não porque seja apaixonado por ela, mas porque foi educado a ter solidariedade, esse tão estranho sentimento. Com o dinheiro escorrendo pelo ralo e o desespero rangendo a porta e cortando a luz, Léo sai para tentar alguma coisa, quiçá um milagre. E encontra o travesti Cibele e seu vapor, a doce, masculina e doída Martin. Cansado de escrever matérias inúteis sobre pré-estréias & celebridades & barracos quando queria salvar o mundo e acabar com a corrupção e toda a podridão humana, Léo se agarra sem perceber à trambiqueira Martin e ao amigo dela, o taxista Wilson.

Uma citação de Rousseau abre o filme e diversas vezes eles tocam no ponto da distribuição social - pobres contra ricos, ideais contra dinheiro -, mas o buraco é mais baixo. É tentar viver e não conseguir. Léo é um cara maneiro. Martin também. Assim como Wilson. Eles não são favelados, nem "cria do sistema". Martin foi abandonada pela mãe, criada por um travesti e recita "As Flores do Mal", do Baudelaire, assim como não quer nada. Eles tampouco são psicopatas como o Zé Pequeno. São apenas números na estatística do IBGE, assim como eu, como você.

Existe uma convenção na construção de roteiros que manda sempre existir um conflito. Os personagens precisam caminhar para esse conflito. Se ele será resolvido ou não, depende da sua filosofia cinematográfica. Mas existem aqueles narradores de história que tecem o roteiro como a vida é - repleta de conflitos e ações que se transfomam em outros conflitos, e à medida que resolvemos um, outros aparecem. O que nos angustia em Janela Indiscreta não é o fato do homem ter matado ou não a mulher - dane-se a mulher -, mas se a nossa querida Grace Kelly irá sair com vida, se o nosso L. B. irá conseguir provar sua louca teoria, e por aí vai. Nós fluimos com o filme, e vivemos com ele por duas horas.

Essa é uma das inúmeras belezas de Se nada mais der certo: você anda com o filme. Você sofre. Você sente que a situação está piorando - mas nunca, nunca ela parece forçada. Nunca é uma situação dita como "escolha estúpida" (sabe filme de terror, em que a/o protagonista sempre toma as PIORES decisões?). Roteiro impecável.

A fotografia é suja, como as cidades são sujas, e como aquele tempo em especial estava impregnado de sujeira - 2006, Lula versus Alckmin. Importante salientar: Belmonte é cria de Brasília. A lama está no ar, escorrendo pelos postes, entrando pelos fios do telefone. A trilha sonora é um caso à parte. O uso dos Saltimbancos (sim, sim, do Chico Buarque com a Nara e a Bebel) foi um dos melhores casamentos entre cinema e música desde Scorsese e Rolling Stones, logo no primeirinho filme do mestre, Ligações Perigosas.

Alguns críticos chamaram a obra de existencialista - tenho medo desse palavrão espantar espectadores. É uma obra, digamos assim, que lança a seguinte pergunta na garganta: será que eu vivo?

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

(ontem, durante a filmagem no mosteiro de são bento, me afastei da equipe, sentei no último banco da igreja e chorei. chorei muito, chorei tudo: as suas dúvidas, as minhas, esse ateísmo que nunca dá brechas, a desconfiança de que atrás do muro não existe nada (e ao contrário do que andam dizendo, aí sim existe tudo a temer). o canto gregoriano era chato, o incenso me provocou uma alergia dos diabos, e fingia a todos um nariz vermelho e irritado. quando queria gritar por respostas. quaisquer que fossem.)

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

engraçado como quando uma parte da vida anda, todo o resto do bolo desanda. ana morde o canto dos dedos quando tem raiva - afinal, a vida deveria ser como numa parada militar, se a frente anda, todo resto atrás segue. mánumémermo.

daí que a pia ainda está entupida, a descarga já anda um tanto quanto exaurida - a pessoa aperta e a água continua a cair, cair, cair -, a cortina da sala nunca mais baixou e as roupas sujas se acumulam ali, ao lado do armário.

ana tentou comprar soda cáustica para a pia da cozinha, mas nem isso deu jeito. resolveu deixar a água suja do jeito que estava. um dia todos engolem, com o cano não será diferente. os canos. vontade de se meter num desses e ir parar em outra cidade, outro país, no japão.

mas que engraçado. não era para se sentir assim, com vontade de sumir quando os concursos, as provas, os ritmos, os dias, as reuniões andam tão bem, quase a pés descalços. na verdade, ana pensa, é questão de conviver com esse pesar no coração - de não saber nunca aonde pertence.

a pia continua entupida.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

da arte de ser velho

(meu timing sempre foi diferente. enquanto elas brincavam de barbie, eu começava a girar copos; quando começarem a sair, eu já havia fugido de casa; e quando, finalmente, respiraram e decidiram abandonar tudo, jogar uma peruca e trocar de identidade, eu já havia cansado do jogo e virei uma senhora respeitável e reconhecida não mais na noite, mas por conquistar o mundo antes do almoço.

encontrar pessoas já foi algo de complicado. hoje eu me reúno em rodas de jazz, em pré-estreias, em casas de chá, em noites de vinho - quanto mais antigo, mais resiste o fígado. boa lição.

não tenho paciência para os jovens, e pior! os velhos com síndrome de adolescentes.)

quinta-feira, 30 de julho de 2009

eu acredito nas palavras, nas vírgulas, nos engasgos e nas malditas. não acredito em imagens, porém, nesse mundo de alterações e montagens. não me levem a mal, não falo dos grandes, como meu tão-grande amigo evandro e o tão-ser-superior cartier bresson, e aquele menino tão bacana, o avedon. esses não fazem imagem, não é, fazem poesia em configuração CYMK. ( eles têm os olhos ágeis, eu tenho dedos histéricos)

mas toda essa introdução é para dizer que não esqueci, que estou aqui, que não morri e que não desisti - depois de muito muito, a parede da minha sala fez um buraco em que recepciona perfeitamente a forma da minha cabeça.

como vocês estão? bem? espero que sim. no rio, faz frio. ainda. chove, neva. umas nuvens negras tão feias, carregam toda a esperança de uma grama verde e cheirosa. eu continuo com quarenta anos - uma vez, li uma entrevista da maria rita em que ela contava ter sempre se sentido muito velha. morava sozinha em nova york, o pai e os irmãos viviam no rio. no aniversário de trinta anos, encontrou-se. hoje vive feliz, e cada vez mais jovem. (percebe-se nas roupas) uma espécie de benjamin button. espero que isso aconteça comigo, e eu morra um bebêzinho de olhos bem verdes e já cansados de tanto mundo.

de resto, os correios roubaram meus livros e meus filmes, e eu não minto aqui, esta é toda a verdade. cansei. agora quero saber apenas do olho-no-olho. e-mail não pode, que o google invade e rouba sua vida to-di-nha. se é carta, os correios roubam para fazer sarau lá em madureira ao som de suas poesias infames. (daqui a pouco dá funk). a saída? só entrego agora em mãos.

outro dia estava saindo do cinema - fui ver um péssimo, péssimo filme com o johnny depp - e avistei três velhinhos, de braços dados, um ajudando o outro a andar, caminhando lentamente e conversando sobre amenidades.

sinto falta. de muita coisa. mas cada vez menos. talvez seja um avanço. talvez seja perda de memória devido a abuso alcóolico.

botafogo

as luzes do dona marta formam
o colar de pérolas
de uma princesa
dado por um gigante
adormecido
do qual ninguém
- nunca mais -
ouviu falar
bolas fumegantes de
azul, vermelho e amarelo
compõem o fino e precioso objeto
fruto de divagações, guerras e análises
- onde dorme tamanho homem?
por que nunca veio resgatar a beldade?
como conseguiu enorme relíquia?
a princesa espera
surda e calada com a porta
do barraco aberta
porque dias melhores virão
como naquele filme do cacá.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

amor

mau humor pela manhã
- você vai perder o emprego
não esquece de pagar as contas
trouxe a comida do gato?

depois, a separação.
você, no cinco meia nove, eu
no cinco oito três a ler
histórias noir com o detetive bogart

(o relógio do jornal
anda quebrado, ao menos há
uma janela, por onde vejo os lírios
se abrindo em setembro)

o reencontro é tão doce.

depois do trânsito
chefe
mal-amado
pernas curtas e
testas longas
conhaque mofado

te ver é o encontro do
mar e da montanha
na praia de botafogo,
em noite de céu estrelado
quando os casais dançam
nos barquinhos
rumo ao infinito.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

sem tempo nem céu
para o rio de janeiro
- suas bundas,
travestis, beijos longos
e suados

empacotei minhas rosas e minhas dores
para subir a serra.

ah, o frio,
o cheiro doce de café

- parece domingo de novo
com heliana e tio josé
na varanda
provocando receitas de família
e bacalhau

eu sento.
acendo um cigarro.
você diz:

- hoje o tempo é de cavalos.

se não há felicidade plena,
existe o silêncio
e a paz.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

terceiro inverno no rio. você acha que ficaria mais fácil, mas qual. é ainda pior.

veio julho, e com ele mais um outro concurso que perdi. dessa vez, não foi de poesia, mas de cinema. a reação, entretanto, é a mesma: vou deixar pra lá esse troço que chamam "arte" e cuidar desse troço que chamam "vida".

lembro de todos os concursos que ganhei. o primeiro, no colégio de padres. o segundo, da tilibra - ganhei três cadernos. minha mãe ficou com dois. e o último, no meu antigo colégio. na hora de declamar a poesia, gelei e não levei o primeiro lugar. mas, ô, gente estúpida! se poeta gostasse de público ia ser ator.

cortei o cabelo. à espera da abertura de alguma cortina celestial a fim de me mostrar o melhor caminho. andar pelo acostamento tem lá suas vantagens e diversões próprias, mas uma direção, de vez em quando, nem que seja sinal de caminhoneiro.

e fica essa dorzinha aqui, costumeira, me avisando que existe uma janela muito fácil de ser aberta, e nela, não se precisa nem pensar.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

... e nessas horas onde o céu desaba, o rio de janeiro nada mais é quem um sonho belo e a vida se enfurna em um desses armários longos de madeira, eu respiro.

se as coisas poderiam ser pior? claro. salvador é uma cidade que fede, em sua transpiração à base de água do mar: desejos e dejetos. ali, na praia do rio vermelho.

não, não é possível voltar. mesmo que você queira. ainda que eu fique sozinha, e que todos nossos planos sejam nuvens.

não é possível voltar. na verdade, meus botões pensam, eu concordo, seria tão mais fácil dissolver-se no mar. esquecer...

terça-feira, 30 de junho de 2009

sobre a vida

sim, mandou lembranças e disse que está bem, claro, com toda a certeza.

(á parte o fato do meu gato ter escolhido a minha "caixa do passado" para dormir e com isso ter jogado fora metade das minhas cartas antigas, com umas tristezas, umas mágoas e uns amores que nunca deveriam ter existido. e claro, aqueles papéis de cartas de início de férias de pessoas que, hoje, só revemos pelo orkut, com desejos para a vida inteira)

o porteiro do meu prédio me odeia desde que meu gato, sim, o mesmo gato, jogou uma garrafa de heneiken em sua cabeça. por conta disso, ele não me entrega as cartas no dia em que elas chegam. aliás, por conta disso, ele mal fala/olha na minha cara. limita-se a enviar os papéis para debaixo da minha porta. por sua vez, meu gato limita-se a empurrá-los para fora. outro dia achei uma conta de luz na escada.

um adendo: eu deveria procurar um emprego, já que essa história de fazer filme não tá rendendo muito, não. instead, estou fazendo pipoca para assistir à so you think you can dance.

por quê minha mãe nunca me colocou numa escola de dança? sofri todos esses anos por não pertencer a esporte algum. encontrei meu tipo de mexer de ossos. vocês já viram?

quinta-feira, 25 de junho de 2009

o centro do rio, mesmo em dias fracos e neblinosos, continua lindo.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

"eu te escrevi poemas de sonhos e dor; falei do seu cabelo loiro aos sábado, quando você se arruma e vai à feira, dos seus pés retorcidos e masculinos, falei até do pequeno sinal atrás da orelha esquerda que você insiste em cobrir com o cabelo.

estrofes inteira foram gastar nas suas pernas, nos domingos sem sol em que meu sofá tinha o grato prazer de receber as suas coxas quentes. (poucos, poucos). gastei papéis inteiros - ainda mai agora, com essa moda de consciência ambiental - descrevendo seus caminhos tortos, e as infitas possibilidades (não aproveitei, eu sei, eu sei).

tentei desenhar-te uma vez. mas não cabia. na tinta, na tela; reprodução nenhuma seria fidedigna.

até hoje, de madrugada, quando encontro uma bituca de cigarro sua - você ficaria orgulhosa, parei de fumar - embaixo do sofá, tenho vergonha de mim por ter recusado o abismo. o seu, você bem sabe."
vamos para são paulo. fazer o quê lá, ela me perguntou.

sei lá. passear, ver a paulista. me disseram que tem uma exposição bacana no masp. não temos dinheiro para isso, ora, ela bufou no sofá.

mas é feriado, todos os nossos amigos vão estar fora do rio; dá pra comprar a passagem com o resto do cartão de crédito e ir segurando até - não dá, porra, já não disse? esse dinheiro é pra gente comer.

porra, a gente vai passar esses quatro dias com a bunda enfiada no sofá sujo, esburacado; esburaco basta eu, lídia! e onde vamos ficar naquela cidade de cão?

na rua.

sério, pô.

existem milhares de viadutos em são paulo.

não me irrita, joão carlos.

tá vendo, você anda muito nervosa. precisa de novos ares. vamos tomar uma cerveja na augusta, ver aquele bando de gente estranha, rir deles como se não houvesse amanhã, amanhecer num bar sujo, comer um pão quente na padaria. porra, lídia, há quanto tempo a gente não come um pão quente com café no balcão da padaria? no rio não tem mais essas coisas, ela disse em voz baixa. tudo agora é loja de suco, de açaí, do caralho a quatro.

então, porra, vamo. a gente arranja dinheiro, pede emprestado, se exibe na praça são bento: "cariocaXXXX em são paulo, quem dá mais?" ela riu. já era um bom começo.




e como se o abismo não estivesse enroscando nos nossos sapatos, fizemos as malas.

terça-feira, 9 de junho de 2009

ah, a chuva que cai sobre a ferida; justamente quando eu acreditei na suavidade, a aspereza da dúvida corta meu sono.
"o tempo vem me intrigando esses dias; mais especificamente, a contagem do tempo. vejamos. no relógio do metrô, são 17h52. no meu, já são 18h. se não estou enganada, saí do trabalho exatamente às 17h45 - no relógio de lá -, para dar tempo de tirar dinheiro. a fila estava grande - uma mulher insistia em usar o caixa eletrônico para pagar um sem-fim de contas, e fui ao outro lado do campus. devo ter demotado três ou quatro minutos para chegar, mais outro minuto gasto na operação de botões, cartões & etc, e outros dois minutos até a estação de metrô. mas isso realmente não importa - o fato é que agora tenho esses oito minutos, vindo de lugar algum, e nenhuma idéia do que fazer com eles. posso admitir que não são meus - eles estão errados. ainda que... afinal, são oito minutos. fica no colo uma sensação de brinquedo dado e depois tirado - eu poderia dormir a mais amanã, ou me demorar 480 segundos a mais no primeiro cigarro. posso guardá-los para uma ocasião especial, em que o silêncio me seja caro, mas não haja especialmente o tempo. a palavra mal dita, o esquecimento raso, o segredo que não. oito minutos. não teria me deitado em lençóis sujos se já conhecesses os minutos de arrependimento.

à minha frente, um homem lamenta o emprego. grita bate sofre rasga a pele bate no peito eu deixei demais, demais, demais, isso foi longe demais demais demais. deveria dar meus preciosos para ele? sujo, feio. talvez eu chegasse mais cedo em casa.

uma vez, em dia de prova, me demorei além da conta no banho; na noite anterior havia conhecido uns ternos lábios e agora pela manhã o desvencilhamento era impossível. água bebida, água desejada. braços, pernas, bocas e sonhos. perdi a prova, a tarde e todo um mês adiante.

e se eu conseguisse esticar, aumentar: triplicar esse tempo-dádiva?

quando o metrô chegou à carioca, encostei a cabeça e sonhei; com cavalos, praias, planetas e seres distantes; sonhei que coletava conchas na areia, uma rosa, outra grande, de formas diferentes, sons e chiados; mas não levei um balde sequer e deixei todas no chão. sonhei ainda com uma parede vazia, eu tentava colar fotos, mas nenhuma cola segurava o suficiente."

domingo, 7 de junho de 2009

se algum dia você me encontrar na rua, não pense que foi por culpa minha: eu não quis.
não contratei detetive,
não enviei cartas,
não paguei a nenhum atendente de telemarketing para rastrear suas ligações;
sequer lembrei da senha do seu e-mail.

eu mudei de bairro, até.

(eu te amei mais do que você merecia. porque sim, EXISTE classificação das pessoas - algumas merecem ser amadas, outras não.)

porque eu passei muitos domingos, senhora, ao som pobre e inócuo de frejat na televisão, sem conseguir dormir; e aliás, minha senhora, eu fiquei muito tempo sem dormir.

porque a dor, a fina e crua dor, de ter se entregue para alguém que não valia a pena, ah, ela marca; fica como uma companheira de luzes, e assim que avista um navio em ânsia de atracar, se fecha: nesse porto, não.

tantas madrugadas subi a bento lisboa - já que agora é para dizer, vou falar a merda inteira -, achando que você poderia, quem sabe, ir vistar aquela sua amiga lá. e perdi muito dinheiro em bares diferentes, imaginando - quer saber, minha cara senhora? você vá para puta que te pariu.

eu só queria ter encontrado as palavras - verdadeiras - dos teus olhos.

domingo de frio

almoçando cup noodles enquanto procrastino uma matéria com deadline tomorrow.

ótimo. estou me sentindo na redação de novo.

***

quando eu era criança, minha diversão era esperar pela madrugada para ver mary poppins (repetido ad infinitum pela globo nas noites de 92 e 93). de uma hora para outra, ela parou de passar. e eu fiquei orfã. procurei em todas as locadoras de salvador (na época, só existia um, a video hobby, com DUAS filiais) e nada. não havia cópia de mary poppins. liguei para a tv bahia e implorei para eles passarem o maldito filme. a resposta? "isso quem decide é a globo, lá do rio de janeiro". não havia internet, não havia telefone da globo.

alguns podem afirmar, agora, que toda a minha decisão de vir para o rio tem um motivo: mary poppins. e certamente não estarão errados.

***

minhas paredes acordaram frias
e nuas
já sem segredo algum
o colar vermelho ficou,
largado no chão,
- você ainda o quer?
estranho
estranho desejo de ser.
sua.

sábado, 6 de junho de 2009

... ah, sim, eles são heróis, sim, silenciosamente enquanto povoam o mundo - assim espero - e invadem a noite suja, mas como você ousa dizer que... não, não há prêmios para eles, nem eles iriam querer; o problema de toda essa gente é não conseguir ver o óbvio, o óbvio ululante, eles se recusam, vão se guardar em suas preciosas camas, e de repente aparecem essas vozes, terríveis - ainda mais quando são macias - denunciando a água suja, o chão mal-lavado; e são ignorados, e sempre serão; o papel do escritor é denunciar: a falta de amor, de ódio (que falta de ódio mata, viu), de bebedeira: é denunciar essa linha estática, essa repetição de reticências que mancha tantos vestidos por aí...
tá um dia feio em laranjeiras. meu porteiro nem saiu de casa hoje - acordei com o moço dos correios batendo na porta: tum, tum, tum, correeeeeeeeeeeeeios. era uma caixa da minha mãe, com livros de roma e um cartãozinho bem safado: "espero que você tenha logo o seu roman holiday". ela não gostou de lá, disse que a cidade cheira à morte, e nessa fase de vida em que se encontra, só quer saber de vida. acho justo.

ontem à noite, tava vendo this is spinal tap! na televisão, abraçada com o gato branco, e não é que o danado inventou de me contar um segredo? assim, bem baixinho ele falou: "somos eu e você contra o mundo". depois ele fechou os olhinhos verdes e dormiu o sono dos justos.

quando chegam essas horas, sabe, quando a confiança foi comprar cigarros e demora além da conta pra chegar, o que a gente faz?

sexta-feira, 5 de junho de 2009

- você lembra?
- do quê?
- de quando o tempo passava devagar?
- quando o sono era mais leve?
- é! você...
- isso tem muito tempo.
- ...
no 490 da rua das laranjeiras tem uma casa linda, linda que só ela, dessas que a gente pensa em comprar caso acerte os seis números da sena, sabe? ela tem três andares e uma garagem enorme - um dia, o dono da casa estava num programa gran torino com o filho, e eu pude ver que ali dentro mora uma moto vermelha - o que me fez gostar mais ainda da casa. o portão é alto, alto, alto, alto e há duas ramificações da escada; no centro, ladrilhado, um desenho de madonna. como laranjeiras, sexta à noite, fica absolutamente silenciosa, às vezes dá para ouvir umas conversas de família na varanda - sei que a mãe faz faxina ouvindo elza soares, e o pai adora jazz, além de querer que o filho seja um bom homem, torcedor do fluminense e coisa e tal. eles não têm cachorro: única coisa estranha.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

escrevi
pequenas possibilidades
no seu guardanapo
quando você saiu

- pensou ter visto um amigo
de longa data
mas qual!
era apenas sombra

cerrei os olhos
à espera
de um futuro azul

- brilhante, que só ele
ao longe, ainda hoje
me manda um alô
e avisa que é quente,
enquanto no rio é julho

mas você seguiu direto
esqueceu da dança
do céu de brigadeiro
e foi pular o carnaval
em outras freguesias.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

"Nem vem que não tem: a onda agora é de Wilson Simonal, redescoberto através dos olhos de Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal no documentário Simonal – Ninguém Sabe o Duro que Dei. Seguidamente, o filme vem sendo aplaudido ao fim das sessões e confirma uma tese em voga: brasileiro adora uma história bem contada.

Depois de sete anos batalhando patrocínio – como contou Cláudio Manoel, as pessoas ou desconheciam o cantor ou não queriam pôr dinheiro em “dedo-duro” -, o documentário chega à tela grande. Para quem não sabe, uma breve explicação: lá nos já quase esquecidos anos 1970, Simonal, negro, rico e arrogante, ao ser informado por seu contador que estava gastando além da conta, achou que estava sendo roubado. Chamou alguns amigos – dois agentes do temido Departamento de Ordem Política e Social, o Dops – para dar uma surra no sujeito.

A mulher do contador, Raphael Viviani (que, pela primeira vez em mais de trinta anos, conta a sua versão do acontecido), deu queixa na delegacia. O cantor, talvez por ingenuidade, talvez por completo desconhecimento político, se gabou de ter amigos na polícia. Foi condenado cinco anos e quatro meses de prisão, tachado de informante, massacrado pela trupe do Pasquim, o jornal-símbolo da esquerda brasileira, e varrido para debaixo do tapete da música popular brasileira até voltar como trilha sonora para Cidade de Deus, de 2002 – quando Cláudio Manoel ouviu “Nem vem que não tem”, e encantou-se pela figura.

...Ninguém sabe o duro que dei é claramente dividido em três partes: a ascensão, a queda e a redenção. Não há dúvidas que a escolha por terminar o documentário com o cantor regendo 20 mil pessoas – ao invés da humilhante aparição, durante os anos 1990, em programas de auditório, pré-Márcia, a fim de inocentar-se – lava a alma de Simonal.

No entanto, por partir do princípio que o espectador jamais ouvira falar dele, usam-se alguns recursos desnecessários. Para mostrar a sua quase onipresença – filme de Domingos Oliveira, programa na Record, dueto com Sarah Vaughan – precisava realmente simular um loop psicodélico a partir do rosto do cantor? O efeito parece mais apropriado ao canal de tevê a cabo especializado em música Multishow que a um documentário. Por outro lado, a restauração das imagens de arquivo é um bálsamo para os olhos já cansados de tanta explosão em 2-D.

Ao fim da produção, que se esquiva do aspecto político da discussão para focar no resgate de Simonal à MPB, uma pergunta fica no ar: onde estava Nelson Motta, todos esses anos, que nunca lançou um livro ou emitiu parecer favorável ao cantor, mas no filme acusa a esquerda brasileira de tê-lo transformado em um 'pária, um leproso'?"

L. S.

sábado, 30 de maio de 2009

na madrugada, dois bilhetes de loteria sem serventia alguma. quando era criança, toda segunda e toda sexta era dia de loteria; uma única vez minha mãe me deixou preencher os números; eu era criança boba e copiei os números vencedores da semana passada. dona heliana brigou comigo, rasgo a aposta e disse que nunca mais eu teria direito a apostar em nada. a única vez em que ela ganhou foi uma quadra, que pagou uns duzentos reais. uma noite, depois da padaria, ela me perguntou "por que você acha que eu nunca vou acertar a sena na vida"? a voz engasgou, não saiu palavra por palavra e eu fingi que não ouvi. mas queria ter dito: coisas boas não acontecem com a gente de graça.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

... poucas pessoas sabem que há um caminho, atrás do museu de arte moderna, que leva diretamente à pista do aeroporto. veja bem: não é ao aeroporto, mas à pista. nunca tinha visto uma tão de perto; uma toalha imensa, xadrez vermelho-e-branco, sobre um chão liso, tão liso, nossa, como é bom andar de bicicleta naquele tapete negro. existem códigos secretos também, regras que valem uma vida - se a luz vermelha acender, é hora de sair correndo; o aeroporto fica à beira do mar, e um vendaval... deitar na pista, avistá-lo enorme, chegando dos céus, sair correndo antes do portão fechar - sim, sim, sempre...

terça-feira, 26 de maio de 2009

cara

hoje vi uma avó
- minha, sua, de qualquer um
em uma scooter amarela
e ela tão livre
e tão bela
e tão solta em laranjeiras
que pensei:
"quem dera!
um dia ser assim..."

domingo, 24 de maio de 2009

... e quando raia o domingo, desses de farta quentura, vapor erguendo-se do asfalto, mal balançam as árvores e como ficam lindas, lindas as meninas nas bicicletas, sim, então surgem as nossas tardes lentas, agora já perdidas, eu cá, você lá, mas persistentes nesses domingos, onde a hora não se dava, as flores não se partiam, as pessoas ficavam - éramos todos, no fundo, uns agregados - e entravam tarde, noite, luzes adentro. não estávamos por um fio; sequer conhecíamos a água suja da angústia, tínhamos lá, claro, nossas pequenas distrações, porque uma vida plena de felicidade é falta de significado, mas ainda caía uma certa chuva de primavera, antes das flores abrirem e de todo, todo o resto desagüar.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

a pior semana do mundo

não foi a pior semana da minha vida mas estava no top 5. (chegou muito perto de derrubar a seqüência de dias em que minha mãe estava no hospital na segunda, ia morrer em uma semana na terça, em 24 horas na quarta, na quinta meu pai já havia arranjado tudo para eu me mudar para a casa dele e na sexta ela deu sinais de vida, mas aí que essa semana tudo começou a se resolver na quinta, então vejamos).

segunda: quando seus pés pisam o chão frio de madeira de laranjeiras numa segunda às 5h30, e decidem voltar na mesma hora, você treme: vai dar merda. a pessoa que iria montar meu filme, o onipresente 569, me entregou uma colagem rameira e mal-feita de seqüências sem sentido algum. nem se godard tivesse tomado um ácido para ver meu filme aquilo teria dado certo. também foi o primeiro dia no emprego novo: além de ter eu ter que passar pela rocinha todos os dias (not nice, not nice, not nice), logo no primeiro dia eu recebo um catatau de 300 páginas para ler. e minha gente, eu choro. choro de desespero.

terça: a matéria sobre tecido acrobático degringola e um novo tema surge: o ano da astronomia. pode ser interessante, mas no mundo da televisão, uma coisa é essencial: autorização de cessão de imagens. e a responsabilidade de conseguir isso é minha. mesmo eu tendo dois empregos, duas faculdades, dois filmes, dois roteiros para terminar... não consegui um lugar para editar o 569. cancelei a gravação de duas irmãs (o nome do próximo, aliás) e desisti de ser cineasta. é muito difícil. ninguém te ajuda. descubro que meu curso, pelo qual paguei 500 reais, é no horário do trabalho. não há reembolso. devo pedir demissão?

quarta: o CLÍMAX. além do curso, a puc fez o favor de marcar palestras e trabalhos também no horário do meu trabalho. that's it, vou pedir demissão. consegui uma ilha de edição. à noite. e no sábado, de 7h às 19h. chantageei, menti, traí. mas consegui a ilha. problema: eu saio de s. conrado, que é do outro lado do rio de janeiro para copacabana, que é O INFERNO do rio de janeiro, para dar aula. e eu preciso fazer o translado em 10 minutos. não consigo, claro. para completar, o motorista me deixa no ponto errado. e eu estou de salto. e assisto a um seqüestro-relâmpago na orla. e pego o ônibus errado para ir para a casa da aluna e ainda tomo esporro do cobrador (eu sou cobrador, como é que a senhora espera que eu saiba contar?). na saída do ônibus, o salto emperra e a professora cai em cima dos mendigos. de copacabana. transtornada, a pessoa já descabelada cai em um choro torrencial e é socorrida pelos IDOSOS do bairro, que a levantam, a ajeitam e a levam ao endereço certo.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

e última coisa, essa para desabafar mesmo.

eu me sinto, de todas as formas, ofendida quando me dizem que eu não posso fumar na rua. a rua é espaço público desde sempre. e não me venha com essa balela de fumante passivo - isso foi uma justificativa que o governo te vendeu e você comprou. porque obviamente, em cinqüenta e três anos de vida, o seu primo morreu de câncer exclusivamente porque trabalhava oito horas por dia ao lado de um cara que fumava. tenho um recado para você: respirar, esse ato tão necessário, libera radicais livres através de gás carbônico que podem gerar células cancerígenas.

fumar virou motivo de vergonha; o meu prazer agora não é nem risco de vida, é risco de prisão. porque eu não tenho dinheiro pra pagar a multa. acho que são 600 reais, não é? 600 reais eu gasto em coisa bem melhor.
eu sou apaixonada pelo rio de janeiro. o rio, para mim, é essa puta velha, com os dentes todos careados, mas que insiste em pôr botox, pintar a raiz de loiro e sair pra night. acho as histórias dessa puta divertídissimas - e ainda vejo muita beleza em seus olhso verdes. mas talvez seja apenas eu.

o meio acadêmico - inclua aí não apenas a universidade em si, mas os teóricos que saem da academia e continuam escrevendo como se ainda estivessem - insistem nessa idéia de cidade partida. ora, estamos todos nesse mesmo barco furado. o professor da renomada faculdade particular no fim de semana vira vendedor de maconha e é assaltado do mesmo jeito. como qualquer um. o transporte público é uma merda para todos os lados - claro que se você tem um carro, parabéns, sua vida é ótima. a minha não. nem dinheiro pra táxi eu tenho. há dias em que eu pego seis ônibus. e ando feito uma infeliz.

você não está seguro em lugar nenhum. nem dentro de casa. sei lá, vai que seu vizinho é um psicopata e ninguém sabe (agora, o mundo criou essa onda onde todo mundo é socio ou psicopata). mas as pessoas insistem em ainda dividir, delimitar as zonas. não adianta. a cidade não é estática. as pessoas não são estáticas.

terça-feira, 12 de maio de 2009

se for pela lua ou pela arrumação dos planetas, se for pela necessidade de coragem latente, se for pela falta de coragem entrecoberta - o fato é: o que me resta é muito.

***

sobre terem comparado o eduardo paes ao giuliani de nova york: os assaltantes, as putas, os travestis, os traficantes, os meninos de rua - todos continuam por aí. agora, quem estaciona carro na calçada paga multa. e cara.

***

no fim de maio gravo meu segundo filme.
hoje foi dia de faxina. joguei sete sacos de lixo apenas de papel. peguei o computador na oficina. reorganizei papéis e documentos. encarar o passado me fez pensar, por cinco minutos, na pessoa que eu sou hoje.

daí joguei o lixo fora, que hoje é dia de reciclável, e MOVE ON.

***
eu ando com tanta raiva da minha vida e isso não é, necessariamente, algo ruim. raiva do medo, da imbecilidade, e mais ainda, da lentidão que eu trago injetada nas veias.

terça-feira, 14 de abril de 2009

um adendo

assim: eu mal como, quando durmo, sonho com o filme e quando tomo banho penso na montagem.

ainda sobre o 569

agora que as filmagens terminaram, vem a segunda parte (talvez a mais trabalhosa): a montagem. sendo a roteirista, a diretora e amiga da editora, minha cabeça vai e volta inúmeras vezes. ellen, a montadora, me avisou que isso aconteceria. o texto de cinema nunca é o mesmo do papel; e é bom que não seja. se fosse, ficaria morto. tudo renasce na hora: o ator muda uma palavra, o diretor corta uma frase porque não é coerente com a cena - ou ainda pior: corta a seqüência inteira.

combinamos o seguinte processo: eu mando o roteiro decupado com indicações de como quero que seja. a ellen, por sua vez, vai assistir a toooooooodo o material filmado, ler o roteiro e imaginar como fica. nesse ínterim, já mudei de idéia sobre como quero o resultado final (óbvio, eu me conheço). e assim vamos que vamos.

e pensar que ainda tem a trilha sonora. e a colorização. e o acerto do áudio.

e os créditos.

domingo, 12 de abril de 2009

ando sonhando com:

- ser assaltada,

- lost (apesar de nunca ter visto um episódio sequer; a cada noite, meu inconsciente me releva um fato novo. anteontem, era conspiração do governo. ontem, estavam mortos. hoje, era um programa de computador);

- atrasos (no dia da primeira diária do meu curta, acordei sete vezes durante a madrugada, achando que tinha perdido a hora, mas foi apenas um exemplo).

terça-feira, 7 de abril de 2009

diário de bordo do 569

dia difícil: o diretor de fotografia foi avisado pela família que vai ter que viajar na semana santa. faltando 24 horas para o início das filmagens, precisei arranjar outro fotógrafo. missão para a produtora. o ator estava desaparecido. eu precisava desenhar o storyboard sendo que não sei desenhar um O no copo.

decidi escrever o storyboard. trabalho do caralho, mas ficou, ao menos, inteligível. na hora, todo diretor sabe, (menos o daniel filho), serão vários takes. posso ter dito que quero dessa e dessa forma outra, mas na hora dos vamos ver... precisava passar no centro para comprar mini-dv. amanhã é aniversário do meu namorado, e ninguém gosta de um passeio ao SAARA como presente. é difícil.

perguntaram se haveria comida/trailer/transporte no set de filmagens. meu amigo, isso aqui é cinema de guerrilha: equipamento da faculdade, equipe pobre mas gente boa, atores de teatro.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

diário de bordo do 569

um filme começa no roteiro. certo. mas ele se torna verdade na produção. o produtor é o arquiteto, o engenheiro; sem ele, o equipamento não chega no dia marcado, as filmagens são paradas por falta de autorização, os atores não decoram no tempo certo. cinema é e sempre será trabalho de equipe, e o diretor necessita estar alinhado com o produtor. no meu caso, por uma falha de alinhamento, a merda: as filmagens vão ser iniciadas uma semana mais cedo. o que é ruim pros atores, pra direção de arte e pro diretor de fotografia: no fim, todo mundo cai um pouco de pára-quedas no projeto. um bom produtor é coisa rara de se encontrar; precisa acordar às três da manhã para acalmar o faniquito da atriz insegura, às sete ligar para o cara da luz, às nove pegar os equipamentos, às onze levar o formulário de autorização em cada uma das locações, às treze, segurar o choro do diretor atormentado, às quinze, apressar a maquiagem e por aí segue. veja bem: a pessoa precisa realmente amar resolver pepino.

domingo, 5 de abril de 2009

O dia lá fora está belíssimo: sol a pino, vento gostoso, essas flores de Laranjeiras. Mas alguma coisa, aqui dentro, não faz sentido.

sábado, 4 de abril de 2009

socorro: tanta vida acontecendo aqui dentro e eu sem saber por onde começar.
essa minha nova liberdade adquirida me proporciona tantas emoções à tarde e à noite: posso baixar filmes durante a madrugada e vejo no dia seguinte; finalmente, tenho tempo para ler o jornal inteiro; acompanho todos os meus blogs queridos e suas respectivas atualizações no twitter; conversar com todos os meus amigos espalhados pelos estados unidos, méxico, índia, salvador e são paulo; bolar roteiros e ter tempo para desenvolvê-los; caçar livros na estante virtual; finalmente aproveitar a promoção da locadora de pague 10 reais por 5 filmes clássicos e fique com eles por uma semana.

acho que estou gostando mais do que deveria, na realidade.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

constantemente te escrevo cartas, que ficam sempre por aqui. queria saber em que tempo, em que data, e principalmente, em que sentido, se deu o nosso silêncio. sinto falta das suas risadas, dos seus olhares, da sua absoluta falta de confiança no universo. éramos fortes juntas. toda vez que regávamos um plano mas a parede continuava lá para batermos a cabeça, ainda assim, insistíamos. na risada. nossa forma de nos vingar do resto; agora, cadê? não te contei do meu garoto que morreu de aids, da data de casamento que foi acertada, não te mandei o roteiro do meu filme, não reclamei sobre a lentidão da minha equipe. você provavelmente nem deve saber onde eu moro agora. só queria entender por quê. como. e se eu posso mudar alguma coisa.

( se não puder, here it is: toda a sorte para você. )

sábado, 28 de março de 2009

hoje foi a primeira reunião do meu curta. obviamente, num bar. a minha produtora, que escolheu a dedo, me apresentou a atriz principal: e jesus, como ela é linda. exatamente como eu havia pensado; sorry, folks, me desculpem as feias, mas beleza, para esse papel, é fundamental. engraçado foi ver todo o sentido que ela deu ao meu roteiro; tornou-se grandioso, enorme, cheio de significados. outras pessoas também leram (o professor de teatro dela, p. exemplo), e cada um deu sua opinião. nessas horas, prefiro ficar muda e calada: para um escritor, é muito mais interessante ver a visão dos leitores sobre sua obra do que sair cagando versos. ou talvez seja apenas para mim. o certo é que meu curta, a quem eu dediquei tempo, suor, lágrimas e amor, muito amor, está sendo feito. há produtores, atores, músicos e fotógrafos envolvidos. eles acreditam no meu texto e na minha direção.

isso é tão grande.

vocês não podem imaginar.

quinta-feira, 26 de março de 2009

há quem diga que pela janela vejo vida a passar;
pois eu replico: aqui há um espetáculo de cores e sons.

***

vejo flores vermelhas que desabrocham na minha sala. no exato momento, não tenho saudade de nada e creio ter derrubado o muro existente entre nostalgia e realidade. como me disse uma amiga, "fala baixo para espantar o mau olhado". mas as tardes andam cada vez mais mornas, as ruas, mais vazias, os planos, mais concretos.

***

a minha faculdade é um lugar tão estranho que as pessoas comentam a minha suposta depressão por ter saído de um emprego oh, tão maravilhoso. pena delas, incapazes de reconhecer um genuíno sorriso de felicidade.

quarta-feira, 25 de março de 2009

ando tropeçando em sonhos. e às vezes alguns se realizam.

***

se pudesse voltar alguns anos, não tomaria diversas atitudes.

but then again - how could I know?

***

de segunda para cá, vi quinze carros do bope quando estava almoçando, ouvi granadas em seqüência quando via um filme, ouvi uma explosão quando saía da faculdade e vi um homem morto a tiros quando voltava para casa.

eu adoro essa cidade, mas viver nessa ilusão de segurança não é a minha.

***

antigamente, estaria te contando diversas coisas, segredos mesmo, coisas dessa alma já cansada. mas cá não preciso mais; tenho quem cuide dessas artimanhas e até acende a vela nas noites mais escuras.

***

sorry, seres humanos: estou com preguiça.

sexta-feira, 20 de março de 2009

agora que eu tenho muito, mas muito tempo livre (na verdade, essa colocação é um tanto quanto idílica; as burocracias do novo apartamento estão me tomando boa parte do dia), é um novo mundo que se descortina: cheio de coisas a fazer, a experimentar, a participar, a assistir. óbvio que estou dando meus pulos aqui e acolá para não passar por privações, mas ainda assim me surpreende a quantidade de vida que eu estava gastando em lugares que odiava apenas para fazer parte da estatística: universitário empregado.

(provavelmente, em umas cinco semanas, eu mude de idéia. até então, estou gostando da situação.)

quarta-feira, 11 de março de 2009

(achei que merecia)

"12 de março, 2009.

(...) E sobre liberdades de escolha, ai... É tão difícil isso que eu vou dizer, mas lá vai: esse excesso de liberdade me angustia. Poder ir para qualquer direção. Não ter controle sobre as ações - porque assim, se eu sair do emprego, posso ficar super bem, legal, ok, OU pode aparecer um curso do, sei lá, Fernando Meirelles no Rio, workshop, 500 reais. E eu vou ficar com cara de CU, chorando todos os dias. E isso é apenas o mínimo.

Lá no jornal, eu sou a mais sacaneada por isso. Eles realmente me pegam de Judas - a justificativa é que eu 'sonho' demais, e quero fazer tudo ao mesmo tempo. E eles, claro, dizem que eu não consigo. Mais um dos motivos para eu me sentir tão sacaneada / para baixo / humilhada / frustrada quando volto pra casa. Trabalho é trabalho, eles não são meus amigos, definitivamente não me conhecem, e certamente não têm que meter o dedo na minha vida. Mas magoa quando você ouve, repetidamente, dia após dia, nego dizendo que você não é capaz de fazer tudo que quer, que é uma confusão ambulante.

(Sabe? No mundo ideal, eu ganho esse concurso de roteiro, mando todos daquele infeliz jornal à merda, e só saio de casa para trabalhar se for com cinema.) Mas eu não tenho grandes esperanças de ganhar; já perdi muito concurso de poesia nessa vida para entender que sempre ganha o normal, o tradicional com roupagem nova, o bonitinho. Nada que eu produzo é "bonitinho". (...)"

domingo, 8 de março de 2009

mais um parênteses, juro que é o último

( depois que o filme acabou, passeando pelos canais. no fantástico, pesquisa para o dia da mulher - afinal, o que você, cara telespectadora, quer? a) um novo namorado; b) um filho; c) um corpo sarado; d) promoção no emprego.

poderia discorrer sobre, mas... nesse calor, vamos dar as mãos, desligar a tevê e abrir uma cerveja, não, caro leitor? )
essa alma nova, mas já cansada, sente saudade de muita coisa, especialmente em um domingo como esse, parado, calado, vazio, todavia irrequieto. sentar lá naquele bar da pituba, debaixo das árvores onde eu quase caí uma vez - e não, não estava bêbada, foi apenas mais um desajeito -, e bater papo. porque sim, ladies e gentlemen, tarefa da qual eu particularmente gosto bastante: mover as idéias para lá e para cá...

um parênteses

( ai, fica todo mundo comentando a tal excomunhão da igreja católica. francamente. ela é assim, sempre foi assim, sempre será assim. a capa do globo vai mudar 2009 anos? não. da folha? não. sua opinião? NOT. então, cagamos. move on. cuidar de assuntos mais importantes, como, quem sabe, a criança. suporte psicológico? quem é a nova família? onde ela vai morar? e coisas desse tipo, sabe.

ninguém lembra, mas a história do pai americano x viúvo brasileiro pela guarda do garoto foi documentada pela dorrit na piauí de uns 10 meses atrás. e a revista foi ameaçada de processo porque o toda a ação é secreta & blá blá blá. e agora eles vão ao FANTÁSTICO explicar suas razões. veja bem: jogue de acordo com suas regras. senão, você fica desacreditado. )
alguns podem chamar de auto-destruição, mas simplesmente quando está tudo calmo, pressinto um problema. é preciso um furacão ou uma tormenta para me tirar de casa, e quando não há nenhuma das duas opções, apenas o rio calmo e suave, parece-me água suja.

não estou falando de problemas, veja bem, longe de mim; mas de tempos atribulados. calmaria, definitivamente, não é meu tempo predileto.

***

eu gostei de slumdog millionaire, mesmo. não me senti ofendida nem creio que boyle esteja querendo fazer essa tal de crítica social. (depois de um certo tempo, a expressão ficou tão pedante, não?)

***

agora, cada vez mais próxima da formatura, as inevitáveis perguntas: - o que você vai fazer depois? - vai continuar no rio de janeiro? - pretende ir para pós? - vai fazer mais um ano de PUC, mas em outra habilitação? - ou vai se mudar para londres? - já se inscreveu naquele programa de trainee? - cuidado, antes que passe o tempo!

eu. não. faço. idéia. do. que. vou. fazer. amanhã.

que dirá daqui a um ano e meio.

***

minha salvador é feia e suja. suas vielas ressoam kid a, do radiohead.

meu rio é abafado e falso. como uma garota viciada em heroína que pensa estar por cima de todos, quando não consegue enxergar nem as próprias marcas.

quinta-feira, 5 de março de 2009

queria entender por que a relação com a minha mãe é tão complicada. sem delírios morais, prezado leitor, sério mesmo. eu a admiro como pessoa e como mãe; mas é verdade que sou uma pessoa fechada. a questão é que, do lado de lá, há a reclamação constante de desconsideração e frieza, do lado de cá, a insatisfação com a pouca procura. sinto falta. sei que sentirei falta a vida toda. tento mudar o meu diálogo e atitude, mas o ponto principal, a meu ver, é que de forma alguma voltarei a salvador. e nenhuma das duas acredita em uma relação profunda à distância.
hoje aconteceu algo tão estranho. estava na fila do café e percebi que estava atrás de mim alguém que, há quatro anos, considerava como um dos meus melhores amigos. Ele não me reconheceu (ou fingiu que). Nada falei - de que adiantaria? Falaríamos sobre a vida, os trabalhos, os amores, estando tudo bem, muito bem, para depois limparmos a consciência? Beber de água suja... Em certa hora, ele atravessou a minha frente para também, oras!, pegar o seu café. Por milésimos de segundo - ou até um frame - ficamos frente a frente. Baixei os olhos; ele levantou os seus. Peguei o meu café e silenciosamente deslizei para a minha vida. Ele ficou esperando.

terça-feira, 3 de março de 2009

the little yellow tricks in life, oh, how they bother me.

domingo, 1 de março de 2009

acordei a fim de devorar a cidade - tudo bem, é aniversário, é clichê, eu entendo. mas ainda assim. essa gente estranha, as ruas tortas, uma réstia de carnaval pelas ruas, os bêbados versando sobre suas mentiras deslavadas. o imperdoável fica bonito quando se está em paz.

(ainda que eu ache que os cariocas deveriam dar um tempo para a cidade poder respirar em paz).

sábado, 28 de fevereiro de 2009

e assim eu fico, nesse vazio tão doído, tão branco, tão limpo. cheguei a jogar as camisas azuis, verdes e vermelhas no chão, para tentar mudar o tempo. não sabia que doía tanto estar tão longe - e o medo às vezes me encontra em uma dessas esquinas sala-quarto-cozinha: e se fosse mais tempo? aconteceu tanta coisa ruim hoje - e todas parecem imensas e flutuantes e vermelhas sem você no sofá para dizer que não foi nada disso, apenas um susto.

[volta logo.]

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

entreouvido na fila do cinema

"hoje fui ver o lutador".

"ah, é?"

"ODIEI"

"por quê?"

"filme RUIM, de gente FODIDA. o cara só se fode o filme TODO. e o final é ainda pior"

"sério?"

"no fim ELE MORRE. eu lá, esperando um final feliz depois de tanta desgraça, e ele MORRE"

"com quem é?"

"aparentemente um cara que era famoso há um tempo atrás e voltou. não sei. mas é FODIDO. cheio de LUTA o filme".


(depois, quando eu digo que não confio em cariocas, nego me chama de mal-humorada)

pílulas de sabedoria

minha vida poderia ser dividida em piadas de mau gosto, piadas de humor negro e pagamento de contas.

jornalismo é escravidão intelectual.

um absurdo mickey rourke não ter ganho o oscar. mas tudo bem, ele já deve ter uns 400 prêmios por wrestler. e aliás, pouco se lhe dá a minha opinião.

acordei hoje às 5h30; terrível: tanto tempo livre e nada a fazer. abri um ian mcewan, terminei. chegou o jornal, péssimo como sempre, desisti. (ainda não sei por que continuo assinando esse jornal, deve ser por medo de pedir o cancelamento). paguei contas.

tentei escrever, mas a manhã não funciona comigo. é fato: manhãs servem apenas para dormir.

(não sou mal-humorada, juro. apenas insatisfeita).

quem dera minha madrinha tivesse uma casa com um armário em que a comida nunca acabasse, a poltrona se ajustasse ao meu corpo e o porão fosse repleto de brinquedos. uma janela seria virada para o mar, a outra para a montanha e a terceira, toda azul, o mais bonito do mundo.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

"você, eu e milhares de pessoas dessa cidade já fizeram das tripas coração para agüentar relacionamentos fracassados".

nunca foi tão certo.

luv u, b.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

desde que era criança, minha mãe me incutiu esse pesado senso de responsabilidade; o mundo, se não for organizado em 90º e seqüência alfabética e cronológica entrará no CAOS e explodirá. isso me tornou uma cdf (o que me garantiu uns namorados no passado e umas bolsas no presente) e uma workaholic apavorada. quando estou trabalhando, ODEIO com todas as forças esses estágios patéticos e ridículos em que fico quinze minutos escrevendo uma nota de três linhas sobre o buraco na rua humaitá e quatro horas sem fazer nada. e quando NÃO estou trabalhando, esse maldito martelo bate na minha cabeça - você não vai ganhar dinheiro? não quer ter experiência?

de ontem para hoje eu tive três conversas particularmente interessantes (sem saber que giraria em torno desse tema).

- a primeira foi com minha amiga judia.

ela arranjou um estágio agora mas não está exatamente feliz (ou não pareceu). em seguida, veio a frase - mas é bom juntar uma grana para depois fazer o que quiser, não é? existem feriados e fins-de-semana. e com a crise, quem sabe quando as pessoas vão arranjar emprego? tem amigo meu trabalhando no SUPERMERCADO (e arregalou os olhos).

- a segunda foi com um ex-professor amigo (ou amigo ex-professor).

"você está trabalhando lá?! mas pelo amor, aquilo não é trabalho para você. é lugar para quem está começando, não sabe direito escrever, mas você escreve roteiros, artigos, poemas, não precisa tomar esporro de policial militar porque um corpo foi despejado no esgoto de vila isabel".

- a terceira foi com meu chefe n.º 3 na escala da hierarquia (e, obviamente, o mais legal)

- seu problema é que você não sabe o que quer, né?

- eu SEI o que eu quero: trabalhar com cinema.

- e o que você tá fazendo aqui?

- tô ganhando dinheiro.

- oh, vou te dizer uma ooisa, tá? eu acho que quando a pessoa é jovem tem que fazer o que der na telha, porque depois, juventude, não dá pra fazer isso, não.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

É complicado falar sobre cinema. Existem filmes bons que não tocam a gente, filmes ruins que tocam a gente, filmes despercebidos que mudam nossa vida, e, de vez em quando, filmes sensacionais que nos tornam diferente em alguma coisa. Milk é um caso complicado - é uma cine-biografia, e como todo filme do gênero tem lá seus defeitos. A narração em off, a visão única e parcial da história, o julgamento de determinados personagens, a busca pela semelhança física mais que pela capacidade de atuar. Mas é um filme que emociona.

Para quem não sabe, Harvey Milk foi um político de San Francisco, California, que nos anos 1970 lutou pelos direitos gays. Era uma época de witch hunt - os Estados Unidos estavam enfrentando o pacote bombástico revolução hippie + revolução feminina + revolução negra, e dentre as várias respostas que o conservadorismo tentou dar à liberdade, a perserguição aos gays foi bastante enfática. O filme é centrado no período em que Milk sai de NY, onde era um vendedor de seguros medroso, apático e preso no armário, e vai a San Francisco, onde se torna o grande ativista.

Sean Penn está muito bem no filme - mas ainda considero a melhor interpretação dele em Sobre meninos e lobos, na pele daquele ex-mafioso confrontado com o passado. Mas enfim. O único que destoou foi Josh Brolin, como o maníaco que mata o prefeito e Milk. (Não, eu não contei o final - nos primeiros cinco segundos isso é revelado). Dan White era um conservador, filho de imigrantes irlandeses, católico e defensor da família e acumulou diversas derrotas políticas de um cara que comemora o aniversário com drag queens. Isso NÃO é tolerado. Isso NÃO é aceito. O que a direção de Gus Van Sant (e o roteiro de Dustin Lance Black) faz é apresentar um cara disposto a cooperar e de repente, da noite para o dia, surta e invade a Prefeitura com uma arma. Nenhuma reação extremista é tomada da noite para o dia, hello. Elas vêem de algo maior mas que por muito tempo foi escondido.

Uma das atitudes mais certas de Milk foi torná-lo bem humorado. Fazer uma cine-biografia trágica seria absolutamente fácil - a luta de um homem pelo direito de exercer sua opção sexual e o modo violento como foi morto. Prato cheio para um dramalhão. Mas Van Sant e Lance Black, que construiu diálogos incríveis, tornaram a história alegre, feliz - esperançosa. A chave mestra de Milk reside nisso: a esperança. É um filme que desperta o melhor (ou eu assim espero) em que o está assistindo.

Resumindo? Milk fala sobre sonhos. E eu sou sempre a favor de sonhos.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

aniversários

"Subi as escadas da velha casa me esgueirando pela parede, temerosa que alguma professora Lola ou algum jornalista Ricardo viesse a perguntar o que havia acontecido. (não precisava preencher qualquer ficha com aniversários ou endereços, bastava apenas pagar em dia)

Pensei ler algum Bukowski, desisti – se é para dançar esse tango, que ao menos não pise nos meus calos. Chorei, chorei, chorei – até começar a sentir que não havia mais nada. Como entrei, saí, e fui parar no Jimmy's. Ele não estava.

Voltei com duas garrafas de vinho, e o assoalho de madeira, o resto de sol, de som, de silêncio, a chuva iniciante, a cama desfeita –

eu tive um amigo, certa feita, que dizia serem as pessoas o melhor da vida. nada importava se estava no país natal dele, com montanhas geladas ao fundo... eram as pessoas. Talvez.

Em um aniversário de vinte e poucos anos, caiu o maior temporal da história do rio de janeiro. As ruas principais ficaram interditadas, os bares fecharam mais cedo, as pessoas se mantiveram com medo; abri um vinho, liguei alguma música, fumei uns cigarros. Meia-noite, o telefone toca – meu pai. completamente bêbado. Perguntou como estava a saúde e quando eu iria para a europa. Respondi que não sabia, as coisas eram difíceis, havia assuntos delicados na cidade, não poderia abandonar meu emprego, meu marido -

Você não pode continuar aí. Precisa ver o mundo.
Eu sei, pai.
Lá no mundo é que as coisas acontecem; aqui nessa merda ninguém mexe o cu para nada; você precisa ver o mundo, Alice!

Eu SEI, pai.

(Nina, se eu pudesse pegar um telefone, eu ligaria e diria isso:

sweet, estou bêbada e hoje é meu aniversário. ignore isso! queria que você estivesse aqui, dividindo esse cigarro e esse vinho (que é muito bom, rodrigo roubou da avó dele). você é uma mulher linda, e apesar de qualquer coisa que esteja acontecendo, for better or worse, I LOVE YOU. você é parte de mim - não tem como falar de alice sem falar de nina, minha doce nina, que agüenta a lot of my craps e para quem eu estarei sempre aqui. tô bêbada, ouvindo tina turner, mas acredite: you're just too hot to hold.

o cd é ika & tina, na época em que ela apanhava do marido e fazia boas músicas )

hoje choveu muito e as flores amarelas invadiram a rua. Pela manhã, veio o gari e limpou. Atrapalhava os carros."

(zig, página 31)
Letícia diz:
ACABEI DE DERRUBAR VINHO NO TECLADO
Letícia diz:
ja volto
Rafa.Reis diz:
ok
Rafa.Reis diz:
meu deus...imaginei MESMO a cena
Rafa.Reis diz:
sua cara tomar vinho em frente ao pc
Rafa.Reis diz:
Let...ñ to conseguindo fumar um cigarro só mais...
Rafa.Reis diz:
só quero fumar 2 de cada vez
Letícia diz:
HAHAHAHAHAAHAHAHAHA
Letícia diz:
COMO ASSIM?
Rafa.Reis diz:
tipo...acaba 1 e quero logo acender outro
Rafa.Reis diz:
acho q vou ter q comprar Marlboro Red, agora
Letícia diz:
MARLBORO RED SALVA VIDAS
Letícia diz:
juro por deus
Rafa.Reis diz:
hahahaha
Letícia diz:
o universo fica mais bonito com marlboro rede
Letícia diz:
*red
Rafa.Reis diz:
uahuahuahuhauha
Rafa.Reis diz:
adooooooro
Rafa.Reis diz:
o Light me deixa super feliz
Rafa.Reis diz:
mas sempre tive uma quedinha pelo Red
Rafa.Reis diz:
só q como Mari fuma o Light e fica "reclamando" do Red
Letícia diz:
O Red é super charmoso, Rafa
Rafa.Reis diz:
acostumei com o Light
Letícia diz:
quer algo mais charmoso que filtro amarelo?
Rafa.Reis diz:
não tem
Letícia diz:
filtro branco is soooooo last century
se vale alguma coisa, hoje estou mais velha. e a todos os meus amigos-leitores, eu desejo muitos livros, muitos filmes, muitos shows e muito dinheiro para arcar com tudo isso.

o resto, a gente inventa.
- você devia voltar. não gosta do rio de janeiro.

- quem disse que eu não gosto do rio de janeiro?

- tudo que você faz, todos os dias, é reclamar da cidade!

- eu não gosto de lugar nenhum, é diferente.

- então você vai viver aonde?

- no meio.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

honestamente, eu desisto.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

nego no mundo todo comemorando aniversário da nouvelle vague. na folha, discute-se se a nouvelle vague não seria o neorrealismo francês, rótulo que, aparentemente, até godard veio a confirmar, no fim do (seu) tempo. tenho a impressão que o cinema brasileiro continua empacado no neorrealismo - desde o cinema novo, há essa necessidade entranhada na carne dos diretores de entender / discutir / analisar / expor a realidade brasileira, benemérita ou vulgar. isso é desde glauber rocha até cláudio assis. de nelson pereira a fernando meirelles. a beleza de meirelles, a meu ver, é ter expandido isso - seu cinema hoje é UNIVERSAL, coisa, que, me desculpem os mais puristas, o neorrealismo nunca será. neorrealismo é cinema regional, e isso não tira a beleza dele. nunca sairá da minha boca que ladrões de bicicleta é um filme ruim ou feio. é LINDÍSSIMO. mas situado em determinado tempo e espaço. quando olho a produção cinematográfica nacional... todos estão sempre querendo justificar o que vemos pela janela do ônibus - não estaria na hora de inventar um disco espacial? de voltar a câmera para dentro do carro, o motorista e seu companheiro? ou dentro de casa? pessoas, a chave sempre são pessoas. sempre.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

meu gato queria ser um cachorro. corre atrás de bolinha, traz nos dentes para alguém jogar, encara um banho sem maiores tropeções, chora de carência. se quisesse ser mulher, e se divertisse com batons (acreditem, minha cachorrinha falecida adorava o cheiro de um perfume específico), mas não - seu problema é antes da sexualidade, é febre de existência. meu gato não suporta ser quem ele é nessa vida; a conduta regular do gato não o apraz - por que ser independente? por que brincar com linho? contudo, meu lou está fadado à infelicidade, pois nessa vida é necessário se contentar com o que foi determinado pelos céus.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

então que eu escrevo roteiros para agências de publicidade, no esquema freelancer da coisa. e vou dizer uma coisa a vocês: SER FREELANCER É UMA MERDA. é excelente quando você é alguém, quando você dá pro dono da agência ou quando você está com a reportagem de capa nas mãos, só esperando pagamento.

em cinema, amigo, as coisas são MUITO diferentes.

para começar que um filme (estamos falando de filmes, não de comerciais) sai do papel entre quatro e seis meses. antes, o pobre do roteirista (eu) pensa, escreve, reescreve, manda para aprovação, recebe de volta, altera a ordem da história, insere falas, corta falas, põe OFF, tira OFF.

e depois, o pobre do roteirista (eu) fica todo feliz, considerando que vai receber o pagamento, afinal, o trabalho ESTÁ FEITO, corrigido, revisado. mas não: produtor quer pagar quando o filme estiver pronto, daqui a quatro ou seis meses.

enquanto isso? sento e choro.

para entornar o caldo, nego vira para o pobre roteirista (eu) e pergunta se não quer ajudar na produção; nessa coisa de conseguir imagens e autorizações, porque, bem, você sabe, o pobre roteirista tem jeito com as pessoas.

rola grana? pergunta o pobre roteirista, já meio acanhado.

NÃO. é tudo PELA ARTE.

nesse momento, o pobre roteirista (eu) saca do bolso esquerdo a peixeira de enfiar nos buchos alheios, rasga metade da agência de comunicação, é preso, julgado e condenado. PELA ARTE.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

eu ODEIO meu trabalho.

que conste nos autos.

domingo, 25 de janeiro de 2009

na vida:

eu estou cansada, muito cansada de ser negligenciada por tudo, até por mim. o universo tem por diversão máxima dar uns bons tapas na minha cara, e tem umas horas que, juro por deus, sinto que não vou conseguir levantar. mas a gente levanta, chora quietinha no banheiro, no máximo aumenta um som (há dias de silêncio também) e se prepara para mais um dia, porque a casa precisa ser levada, as rosas postas no lugar, o gato ensaboado e o ônibus passa exatamente às 13h45.

no msn:

L. diz:
cara, o universo precisa parar de ficar dando tapa na cara da gente
b.diz:
não é? tá ficando sem graça.
b. diz:
é muita falta de humanidade dessas pessoas.
L. diz:
eu sou a favor da gente arrancar uns tacos de beisebol e ir atrás dessas pessoas.
b. diz:
eu quero arranjar um lugar pra divulgar essas coisas, citando nomes.
L. diz:
se tivesse um site-Procon, a gente mandava e-mail explicando a história com nomes e links
L. diz:
NUNCA CONFIEM NESSAS PESSOAS

****

M. diz:
as pessoas são felizes, gata
M. diz:
as pessoas discutem sobre tantas coisas que não me concernem, ao menos, não agora.
Mar diz:
as pessoas querem justificativas
M. diz:
pra melancolia
M. diz:
fala sério
L. diz:
pois é! elas precisam de um fim de namoro, de um câncer ou de sei lá o quê
M. diz:
éé
L. diz:
ou quando eu tento arriscar um "é, estou meio confusa sobre alguns aspectos da minha vida'
L. diz:
vem aquelas terríveis SOLUÇÕES
L. diz:
porque obviamente, há SOLUÇÃO para tudo.
nesse ano, com apenas 26 dias, todas as minhas ações já resultaram em desastre. para não pegar muito pesado em cima do pobre coitado que mal teve tempo de mostrar as habilidades, algumas decisões foram do ano passado, esse sim, terrível.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

pensando bem, o maior saldo de ter vindo para o rio de janeiro e desses quase dois anos e três meses foi muito maior que essa mera faculdade; foram dados grandes passos nesse estranho processo de ser quem eu sou. determinadas atitudes toleráveis até dois anos e três meses atrás hoje são motivo para nunca mais cruzar com determinado ser humano. ainda bem para mim. entendi, finalmente, que não é preciso gostar de TODAS as pessoas para ser alguém; aprendi a ser sozinha. quando era adolescente, adorava a solidão; mas era por escolha. existiram noites em que chorei tal qual cabrita agarrada à parede de medo e dor (e ainda virão muitas), mas hoje o silêncio não-escolhido me é confortável. especialmente, aprendi a sobreviver ainda que o universo não queira e bata na sua cara quinze, dezessete, vinte e nove vezes, que é para você entender a mensagem direito. é preciso acordar todos os dias, especialmente para pagar contas, antes das filas dominarem tudo. não é?
sem dinheiro, trabalhando novamente em algo que detesto, casa completamente bagunçada, série de burocracias à espera de serem cumpridas - mas tudo isso desaparece quando vejo um filme.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

the wrestler, como todos os filmes do Darren Aronofsky, é breathtaking, emocionante, dilacerador e pesado. o diretor pega todas as suas emoções - felicidade, conforto, desespero, horror -, coloca-as num saco e despeja à sua frente, uma após a outra. costumo dizer que os filmes dele são maravilhosos, mas eu não quero ver novamente. quem tem estômago forte para rever réquiem for a dream duas vezes, parabéns. eu não.

quando era adolescente, queria casar com mickey rourke. ele era o cara de selvagem da motocicleta! o motoqueiro misterioso, com voz sussurrada, surdo do ouvido direito. aquele filme significou muito para mim (por motivos além do rouke, claro). e vê-lo agora, totalmente desfigurado e reposto, em um papel tão talhado para ele... claro que o aronofsky sabia quem escalar quando pensou nesse papel, quando leu esse roteiro. a trajetória de randy e rouke se entrecruzam em muitos caminhos - ídolos dos anos 80, tentam viver no passado, lutadores.

o que é aronofsky faz é nos mostrar a trajetória desse cara, "the world gives a shit to me", que só encontra paz / realização / desejo / amor nos ringues. E how to handle this quando ele descobre estar com um problema no coração, e por isso não poder mais lutar. o argumento é clichê? é. mas a forma como é feita, não.

scorsese, em ranging bull nos mostra a decadência de jack la motta com muito estilo, através de várias décadas, com uma fotografia sublime e direção de câmera idem. não é uma crítica, muito pelo contrário - touro indomável é dos meus filmes prediletos. also breathtaking. mas the wrestler vai na ferida da carne, enfia a faca no peito, me fez gritar de dor. se randy sentia, eu sentia.

o final é a síntese perfeita do trabalho desse diretor tão contundente - você deveria sofrer, mas está feliz. deveria estar feliz, mas sofre. onde engavetar essas emoções? como classificá-las? aronofsky quer exatamente essa reação: não há nada que não possa ser removido do lugar.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

não vá se perder por aí, mutantes me lembra nina pela difusão, estranheza, nostalgia, cor.

reptilia, strokes me lembra guilherme pela rapidez, vivacidade, urgência, sexualidade.

let it bleed, rolling stones me lembra fabio pela amizade, ilicitude, insônia, celebração.

bubble gum years, gomez me lembra gabriela pela dualidade, intimidade, sofisticação, mágoa.

let's dance, david bowie me lembra o bê pela vivacidade, pelo sarcasmo, brilhantismo e let it go way of life

jesus, velvet underground foi a minha música de 2008; para eu aprender a ter fé até no que não acredito. apenas assim para agüentar a Realidade.
- eu te liguei, liguei várias vezes, acredita? e você, perversamente, nesse advérbio tão cheio de rancor e cinismo, se recusou a atender as chamadas. quando atendeu, aliás, o tom de voz era tão enfadonho - nossa, será realmente dada a mim a honra de ser a mais entediante pessoa do universo? - que não controlei as lágrimas, desculpe-me. todos os pedaços de sanidade, com a minha assinatura, claro, voltaram a se espalhar pelo chão, e ah, montar esse quebra-cabeça novamente vai ser tão complicado. ah, todos nós pecamos, mas amavéis daqueles que escondem sorrateiramente a sujeira; a cada dia se sofre mais um pouco, e a grande merda, a merda de verdade, é não distingüir sofrimento de liberdade.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

(Ás vezes, de noite, sinto esse medo agudo, como se se eu não for para minha casa no exato momento, todo o meu mundo entrará em colapso e será sufocado pela escuridão. Começou na noite do reveillon, que ironia; acordei na madrugada, sem ar, esmagada por algo que não conseguia ver, apenas sentir. Eu precisava de luz ou todo o oxigênio dentro dos meus pulmões iria acabar em cinco, quatro, três. Outra noite foi quando não consegui achar meus óculos; apesar disso acontecer tão freqüentemente, e de não precisar da visão apurada – estava indo dormir! - veio a mesma sensação de enclausuramento; como se as paredes, o mofo tivesse corroído as minhas paredes e me restassem poucos segundos de vida. Agarro-me à escrita como necessidade para respirar; as pessoas normais possuem nariz, boca; eu só tenho minha caneta. Se Henry Miller me indagasse a minha tão especialidade para contar a todo o mundo minhas histórias, assim responderia: escrever é a minha ponte para a realidade.)

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

se você me perguntar, sincera e honestamente, por que minha vida segue por determinados caminhos, eu não sei responder. não sei dizer, por exemplo, por que vim para o rio de janeiro, e não fui para porto alegre ou são paulo. tampouco saberia argumentar caso alguém me apontasse o dedo: você é incapaz de afirmar por que deixou de ser ruiva. é verdade. o universo me joga cartas, eu as aceito sem pensar, e no balanço geral, talvez esteja mais para positivo. eu vivo sem perceber.

mas a questão, agora, é: como se livrar de uma carta torta quando não há nenhuma outra sendo jogada? sento e choro?

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

eu tenho medo de sair na rua e quando voltar, você ter desaparecido; tenho medo de dormir e ao acordar não ver seus braços; tenho medo de cair e você não me segurar, e sinto que se isso acontecer, minha queda atravessará décadas, séculos, memórias e sentimentos; não fecho as pálpebras com medo de tornar-me cega ao abrir, e o cigarro está apagado por medo de incendiar a casa com esse cheiro de veneno; sou um grande medo diário tentacular.
arrancaram o que de mais precioso existia em mim; agora, só essa janela semi-enterrada, a cama desfeita, alguns parcos badulaques pendurados no teto.

prefiro morrer a não ter você comigo.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Foi Martin quem me chamou a atenção para as luzes; ainda mais quando vistas do nosso casarão. - Ás vezes penso que não sei mais escrever, Martin; como se todas as palavras tivessem desaparecido nesse sufoco mudo e seco, ou se extraviado em alguma das minhas andanças. Outras vezes penso que como não encontrei nenhuma respostas e as perguntas ainda moram nos meus ombros, as palavras desistiram de resistir e foram encontrar outro corpo, mais quente e mais corajoso.
As luzes de Buenos Aires são graciosas, dançam no ar, brincam de pequenas orgias. Da minha janela no albergue, elas parecem certeiras; do casarão onde Martin me trouxe, cheias de desespero. A cidade é desorganizada, e as pessoas vivem como se um tango ininterrupto as regesse em cada esquina – gritam, gesticulam, as mãos engolem os braços, o corpo transforma-se em massa cambaleante. Ou talvez seja a enorme quantidade de vinho argentino.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

salvador vive de axé; as pessoas realmente gostam disso, além da parte óbvia da grana. Existem os fazedores de axé, os tocadores, os cantadores, os dançarinos, os que cobram para ver toda essa parafernália e os que pagam para. Existiram duas fases do axé – e sabe-se lá quantas ainda virão por aí – e os primeiros estão velhos, com dores nas juntas e isolados em suas mansões. Vez ou outra, algum deles aparece tentando algum processo modernoso de ressuscitação.

Esse era o caso; o tal artista de axé fracasso havia fechado uma casa "da moda" da cidade, um desses lugares os endinheirados podem escutar música eletrônica e bater palmas à vontade. Estranho fato: nesse lugar, as pessoas com mais dinheiro nunca enlouquecem. As pobres e fodidas agarram-se nas paredes para não voltar à cama dura. Qualquer lugar fora de casa é mais que suficiente; e ainda assim, esses indivíduos todos estáticos, segurando os copos laranja-avermelhados – oh, tão belos! -, com tantos anéis nas mãos, saltos altíssimos e cigarros mentolados, trocam conversas tão interessantes sobre a família – como vai o senhor seu pai, e a namorada do nosso tão querido seu irmão? -, a vida pública – e a faculdade? e o seu tão senhor chefe ainda está a incomodar muito?, e quem está na coluna social da semana. Ah, não, desculpe, eles todos estão muito ocupados.