sexta-feira, 28 de agosto de 2009

na sexta, no sábado e hoje. dias bonitos pra caralho no rio. é tão estranho isso. acordei, peguei o jornal na porta de casa, li e reli, estirei as pernas, o lou deitou na minha barriga. os sonhos ficaram para amanhã, depois, quem sabe; depois de vinte e um anos de angústia, precisava me acalmar. sem sair de casa. falando pouco com os amigos. tempo de reclusão mesmo. mas nada de triste, não se preocupe, sou apenas eu e meus gatos.

sensação estranha essa, de felicidade, de tudo no lugar; a gente tão acostumada com a insuficiência, quando abre os olhos para a completude parece que há uma peça estranha no quebra-cabeça.

não tenho planos para o reveillon, não faço idéia de onde estarei no natal, abandonei completamente o jornalismo e em um domingo de sol procuro passagens para buenos aires no carnaval. estão baratas, inclusive.

gosto de dançar com você, e cada vez mais. quando nos conhecemos, éramos um twist-salto-duplo no infinito: enfurecidos, de casacos de couro, na lambreta velha de papai. passamos por uma onda new wave e até uma fase gótica (ou punk, como preferir). estamos hoje bem bailando valsa, e não há necessidade de banda nem orquestra - com assobios leves, marcamos o compasso na mão e tchá, um pra lá, tchátchá, dois pra cá.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

(a vida é cheia de som e fúria)

raios, trovões
um engarrafamento de pensamentos
na marquês de são vicente
a manhã chuvosa manchou o
espelho de águas-claras
dormente de desejo
- não imaginava ser acordado tão cedo
a senhora hoje me serviu pingado,
quando pedi amargo
e mal reparei nas flores amarelas
de laranjeiras
pois o mar acordou raivoso
semeando furacões
com o sorriso do moço
espumado à areia.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Se nada mais der certo

Não sei e nem me atrevo a definir o que é arte. Sei do que sinto e sei quando bate - quando machuca, quando trava a língua e quando arde. Na teoria, fazer um filme deveria reunir todas as seis grandes artes; é a única forma, para mim, capaz de juntar pintura, literatura, teatro, música, e ainda assim dar certo (quando dá). E no caso de Se nada mais der certo, do Belmonte, dá até demais. Dá certo até de faltar o ar.

A trama é simples: um jornalista cheio de ideais mas desempregado, que sustenta - mais que isso, ele é a força que faz essa mulher viver - uma anoréxica junkie e seu filho, não porque seja apaixonado por ela, mas porque foi educado a ter solidariedade, esse tão estranho sentimento. Com o dinheiro escorrendo pelo ralo e o desespero rangendo a porta e cortando a luz, Léo sai para tentar alguma coisa, quiçá um milagre. E encontra o travesti Cibele e seu vapor, a doce, masculina e doída Martin. Cansado de escrever matérias inúteis sobre pré-estréias & celebridades & barracos quando queria salvar o mundo e acabar com a corrupção e toda a podridão humana, Léo se agarra sem perceber à trambiqueira Martin e ao amigo dela, o taxista Wilson.

Uma citação de Rousseau abre o filme e diversas vezes eles tocam no ponto da distribuição social - pobres contra ricos, ideais contra dinheiro -, mas o buraco é mais baixo. É tentar viver e não conseguir. Léo é um cara maneiro. Martin também. Assim como Wilson. Eles não são favelados, nem "cria do sistema". Martin foi abandonada pela mãe, criada por um travesti e recita "As Flores do Mal", do Baudelaire, assim como não quer nada. Eles tampouco são psicopatas como o Zé Pequeno. São apenas números na estatística do IBGE, assim como eu, como você.

Existe uma convenção na construção de roteiros que manda sempre existir um conflito. Os personagens precisam caminhar para esse conflito. Se ele será resolvido ou não, depende da sua filosofia cinematográfica. Mas existem aqueles narradores de história que tecem o roteiro como a vida é - repleta de conflitos e ações que se transfomam em outros conflitos, e à medida que resolvemos um, outros aparecem. O que nos angustia em Janela Indiscreta não é o fato do homem ter matado ou não a mulher - dane-se a mulher -, mas se a nossa querida Grace Kelly irá sair com vida, se o nosso L. B. irá conseguir provar sua louca teoria, e por aí vai. Nós fluimos com o filme, e vivemos com ele por duas horas.

Essa é uma das inúmeras belezas de Se nada mais der certo: você anda com o filme. Você sofre. Você sente que a situação está piorando - mas nunca, nunca ela parece forçada. Nunca é uma situação dita como "escolha estúpida" (sabe filme de terror, em que a/o protagonista sempre toma as PIORES decisões?). Roteiro impecável.

A fotografia é suja, como as cidades são sujas, e como aquele tempo em especial estava impregnado de sujeira - 2006, Lula versus Alckmin. Importante salientar: Belmonte é cria de Brasília. A lama está no ar, escorrendo pelos postes, entrando pelos fios do telefone. A trilha sonora é um caso à parte. O uso dos Saltimbancos (sim, sim, do Chico Buarque com a Nara e a Bebel) foi um dos melhores casamentos entre cinema e música desde Scorsese e Rolling Stones, logo no primeirinho filme do mestre, Ligações Perigosas.

Alguns críticos chamaram a obra de existencialista - tenho medo desse palavrão espantar espectadores. É uma obra, digamos assim, que lança a seguinte pergunta na garganta: será que eu vivo?

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

(ontem, durante a filmagem no mosteiro de são bento, me afastei da equipe, sentei no último banco da igreja e chorei. chorei muito, chorei tudo: as suas dúvidas, as minhas, esse ateísmo que nunca dá brechas, a desconfiança de que atrás do muro não existe nada (e ao contrário do que andam dizendo, aí sim existe tudo a temer). o canto gregoriano era chato, o incenso me provocou uma alergia dos diabos, e fingia a todos um nariz vermelho e irritado. quando queria gritar por respostas. quaisquer que fossem.)

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

engraçado como quando uma parte da vida anda, todo o resto do bolo desanda. ana morde o canto dos dedos quando tem raiva - afinal, a vida deveria ser como numa parada militar, se a frente anda, todo resto atrás segue. mánumémermo.

daí que a pia ainda está entupida, a descarga já anda um tanto quanto exaurida - a pessoa aperta e a água continua a cair, cair, cair -, a cortina da sala nunca mais baixou e as roupas sujas se acumulam ali, ao lado do armário.

ana tentou comprar soda cáustica para a pia da cozinha, mas nem isso deu jeito. resolveu deixar a água suja do jeito que estava. um dia todos engolem, com o cano não será diferente. os canos. vontade de se meter num desses e ir parar em outra cidade, outro país, no japão.

mas que engraçado. não era para se sentir assim, com vontade de sumir quando os concursos, as provas, os ritmos, os dias, as reuniões andam tão bem, quase a pés descalços. na verdade, ana pensa, é questão de conviver com esse pesar no coração - de não saber nunca aonde pertence.

a pia continua entupida.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

da arte de ser velho

(meu timing sempre foi diferente. enquanto elas brincavam de barbie, eu começava a girar copos; quando começarem a sair, eu já havia fugido de casa; e quando, finalmente, respiraram e decidiram abandonar tudo, jogar uma peruca e trocar de identidade, eu já havia cansado do jogo e virei uma senhora respeitável e reconhecida não mais na noite, mas por conquistar o mundo antes do almoço.

encontrar pessoas já foi algo de complicado. hoje eu me reúno em rodas de jazz, em pré-estreias, em casas de chá, em noites de vinho - quanto mais antigo, mais resiste o fígado. boa lição.

não tenho paciência para os jovens, e pior! os velhos com síndrome de adolescentes.)