domingo, 31 de janeiro de 2010

o melhor de passar uma semana em são paulo - my dear paulicéia - não vai ser o masp nem a pinacoteca nem o ibirapuera nem a oscar freire com suas garotas tão belas.

reencontrar ricardo, meu caro tão caro escritor, preso no seu cinzeiro cheio de bitucas apagadas. ou carol, minha doce atriz. nunca mais parei um estranho na rua para perguntar sobre a vida. só faz sentido com você. assim como o champanhe só tem gosto se for gelado. e ruivo.

meu querido lucc, vamos lá, vamos sentar naquele bar em moema, reclamar do nosso ódio eterno a salvador - entremeado com saudades -, da especulação imobiliária, rir das nossas cantorias toscas, acender mais um cigarro, quem sabe misturar uma vodka e pensar que o dia de amanhã pode ser melhor, afinal, nós pagamos nossos impostos.

marina. como vai ser bom te ver. vamos falar mal de avatar e toda essa tecnologia imbecil na varanda do masp? tomando um café? ou naquele bar vinte-e-quatro-horas-que-na-verdade-são-dezessete, ao lado de um pint? precisamos de inspiração. joi de vivre, não era isso? como éramos bobas. crianças. e agora estamos aqui, na paulista. que saudade, marina.
quando resta apenas o silêncio, as bocas cansadas têm como fio de esperança o sol do dia seguinte.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

uma gata dos olhos azuis apareceu por aqui. tasquei-lhe conchita. gostou! ela até responde quando a chamo. conchita dorme mais do que eu e me acorda cedo, quase madrugada, para passear. é uma gata, veja bem, não um qualquer cão. abro a porta, pernas bambas do sonho mal acordado, sol batendo na fuça, e ela sai, rebolando. deita no quintal, espreguiça, rola, rala, volta, toma banho. se eu ameaço voltar para o lar doce lar minha cama, conchita reclama. ô. nasci pr'isso não, moça. pra piorar, conchita ainda compartilha do meu péssimo gosto: fred astaire. numa dessas madrugadas estava passando o picolino de novo (sabe? 'heaven, i'm in heaven?'), e eu fiquei, tal qual boba, de coração apertado querendo ser a ginger.

mas num é que a gatinha senta no meu colo, pára bem quietinha, abre os olhos azuis e fica hipnotizada por fred? ô.

[ou talvez conchita simplesmente tenha a sabedoria daqueles que concordam sem nem arregaçar os dentes.]
only place there's safety is house
when my yesterday smelled carpet
welcomes me and conchita, the cat
poures coffee all over

but one must gamble:
cross the street and go to the bank
say hello to lillies
- even buy some and give to that old friend of yours
and do the unpleasant
by turning off ears fingers eyes
and just care, only care
about dreams
and love
and leaves
and tomorrows

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

sem nem saber por quê, alice saiu catando folha atrás de folha na estante preta, procurando um número de telefone, um sobrenome, uma indicaçaõ de rua (ao lado da padaria? perto da escola são luís? onde, deus, onde?), uma seta para se guiar. tinha apenas o nome, a porcaria do nome, e um e-mail velho, porque claro que seis anos depois ninguém usa o mesmo caralho de e-mail. o mundo era mais fácil quando as pessoas não perdiam senhas, a telemar cobrava caro por uma assinatura de telefone (então, as grandes famílias brasileiras tinham uma e tão somente uma linha) e a inscrição na lista telefônica era obrigatória. nem alice tem registro na lista. e olha que ela tenta fazer parte da sociedade.

e eis o começo: sentada em um banco, à espera de uma entrevista, ela o vê. alice calcula rapidamente seis anos - cresceu cinco centímetros, o cabelo escureceu, a calça jeans continua no mesmo tom de azul. o que está diferente? nada. mantém até o cavanhaque. olha para baixo: ela sim, está diferente. talvez seja por isso que ele fale nada: não a reconheceu. acalenta essa hipótese por alguns minutos. seria? será? tão diferente isso?

não, claro que não. maracas, por favor.

revira e vira caderno: fotos do início do século, dez, doze anos atrás. mue deus, quanto tempo passou e eu não vi, só alice que não viu. O relógio anda, as horas passam: é impossível encontrar uma indicação desse ser. para onde foi, para onde vai; ficaram apenas os minutos minutos minutos manchados de passado.

[continua]

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

me salva;

me salva.

aqui nessa selva de itaipavas, ouvindo beatles até não agüentar mais - i told you about strawberry fields, where nothing is real -, tramando tramóias pernósticas pelo msn.

era assim que você se imaginou aos vinte anos?

amigo, faltou luz hoje na glória. tudo estava às escuras. roubaram minha pele e eu virei isso aqui: um travesti.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

o viralata

uma ligação às dez da manhã: cerveja hoje? mas é claro, quem recusa a possibilidade de uma noite sem estrela alguma, mas sem hora para acabar? deve ser efeito de amizades antigas que nos deixam (me deixa) tão emocional.

mas oito horas da noite e nada. nove e nada. onze e meia, avisto um cabeludo no metrô, de abraços abertos, sem importar-se muito com os mendigos e travestis que a essa hora já dominaram o chão da glória. ah, laranjeiras, sinto saudades de ti nessas horas.

o viralata é largado e charmoso; o charme reside nesse completo desligamento do que acontece à sua volta - estouram bombas, ele acende um cigarro e continua contando sobre como o caminhoneiro que deu carona em volta redonda estava com os olhos vermelhos de arrebite. e você se pergunta "JESUS FUCKING CHRIST, essa pessoa ainda não percebeu que o mundo ESTÁ ACABANDO?!" mas entre a opção de se render ao bombardeio e continuar escutando as histórias sobre emérson, bem. you know what i mean.

diz que tem saudade de tantos: do meu marido, dos nossos antigos amigos, dos nossos antigos terrenos baldios. não atura são paulo; em verdade, não atura lugar algum. nada contra o rio de janeiro, é só que seis meses parado em um lugar é angustiante. quer conhecer mundo, quer virar copos, ser mil em um, morrer de amor e voltar. quer contar histórias, é jornalista à moda antiga, desses que não gravam, não fotografam, não inquerem. deseja conhecer, conhecer, conhecer e contar. ele sorri e replica que no fundo eu sou assim, também. "não, não, eu gosto é de ficção".

no livro dele, aliás, as primeiras sílabas que junto são essas: "eu gosto é de ficção!". ao ler pela primeira vez, me senti uma antiga hippie LUTANDO CONTRA O SISTEMA (inclua seu riso irônico aqui), pintando frases de guerrilha sentimental ("o amor é sexualmente transmissível", "one thing i could tell you is you got to be free") nas paredes, hospedando oito pessoas ao mesmo tempo em um quarto-e-sala de 40m². ele escreve que eu choro, e é verdade. mas também diz que jamais falaria algo para não magoar ninguém - será? tão estranho me ler na visão de outros.

lá na nova casa, sentou-se, tirou os tênis, acendeu um cigarro - "tá quente demais, ô" - e tomou um susto. uma sala grande, três quartos: quem diria? fogão. "subiu mais um degrau na hierarquia, não é?", diz, sorrindo, um elogio. para uma ex-hippie, seria mesmo? tento argumentar e dizer que planejo sair por aí, viajando de carro, rodando a américa latina, filmando, fazendo documentários. (a verdade é: envelheci vinte anos em poucos meses).

bebendo, criamos planos. "vamos pegar o fusca, nós três, e ir do rio de janeiro ao chile!". em buenos aires, seremos músicos, no uruguai, venderemos poesia. no chile, encontraremos amigos. no fim, vamos escrever um livro e fazer um filme! "a saída para a sanidade está em mudar constantemente", ele me explica. vamos, vamos, que o dia já já amanhece; vamos pegar pedro e sair rodando pela américa latina. sonhos bons. porque são sonhos.

no ônibus indo para mauá, leio seu livro avidamente. ele não gosta: não da leitura, mas do resultado em si. considera "chato", "pouco jornalístico". talvez mal revisado. coloquial demais, quem sabe. eu gosto. paro, tiro dúvidas, pergunto sobre histórias que eram muito boas para caberem em uma folha de papel. a cada caminheiro que passa, ele fixa o olhar - "pode ser alguém que eu conheça".

"os melhores caminheiros são os mineiros. cariocas são marrentos. o arrebite é a droga da estrada, e o cara nao deveria tomar de jeito nenhum. mas precisa fazer a carga chegar de qualquer jeito, no menor tempo possível".

(lembro que já quis muito, como meta de vida, descer o brasil, da bahia ao rio grande de sul, de caminhão. mas o sexo é uma merda. em quatro meses de viagem, se eu permanecesse virgem seria deus descendo à terra e avisando que iria parir o novo jesus)

o que ficou marcado: julho nos encontraremos de novo. nem que seja para ir a porto alegre. pegar a estrada, sem dinheiro, tocando em churrascaria. até lá. boa sorte nessa paulicéia atormentada. não desiste até julho. (que besteira, quem disse que você é de desistir?)

os baianos do rio de janeiro mandam aquele abraço pro mineiro de são paulo.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

i miss you
because i can't cook when
you're not here to cut onions
or expell postmen in saturday mornings
i miss you
because i can't sleep without
safety in your eyes
because hands seem smaller
and world seems faster
when you're not around.

i miss you
in this hot fuzzy night
to drink cold water
say it's champagne
and toast life.

domingo, 10 de janeiro de 2010

estava andando na rua e o corpo de uma mulher reunia homens e velhos, mulheres e crianças. coberto por um saco plástico - ainda assim, via-se que era mulher. já li alguns estudos sobre suicidas que dizem poder ler os últimos pensamentos da pessoa a partir da maneira como ela cai no chão. a mulher, de 27 anos (ouvi a conversa no elevador, entre os policiais), havia caído com a barriga para cima e as pernas abertas. os pés torceram com a queda. matou-se como um anjo - foi à varanda do shopping com a vista mais bonita do rio de janeiro, subiu no parapeito, sentou e abriu os braços.

o prédio da minha mãe, em salvador, nunca teve essas bobagens territoriais - quem é você, aonde vai, com autorização de quem. normal, normalíssimo ser acordada por amigos ou receber uma campainhada (a versão caseira da buzinada) quando me atrasava. mas por essa falta de desconfiança, o prédio virou lugar de suicidas. mulheres suicidas. elas entravam, iam até o 14º andar e pulavam pela janela no corredor. após a terceira, o síndico instalou ordens nazistas de entrada: cada morador possuía uma lista de quem entrava e quem saía. o convidado chegava, ficava parado no primeiro portão, esperando o reconhecimento por voz. caso a pessoa não estivesse ou não atendesse o interfone, bye bye. volte outro dia. farmácia, pizza, médico em emergência? tinham que ser atendidos do lado de fora. ninguém sabe até onde vai a loucura de um suicida. a ameaça pode aparecer fantasiada, alardeava o síndico.

enquanto todos os moradores abraçaram as medidas - com mais veemência aqueles com o carro sujo de miolos -, pensava a todo tempo que o síndico estava tirando a liberdade dessas mulheres (uma doméstica, uma amante abandonada e uma dona de casa com três filhos) de fazerem o que bem entender com as próprias vidas.

isso voltou à cabeça hoje, quando vi jornalistas ávidos por sangue - abutres - e pessoas desesperadas (por quê minha gente? se você não é da família, controle-se.) à volta do saco plástico preto.

mulheres.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

el cubano

Atenção, autoridades cubanas! Um refugiado político encontra-se no interior do Rio de Janeiro, vivendo à beira de mojitos, no alto do Rio Preto. Ainda pior: acaba de lançar um disco, em que conta causos e cositas más dos 25 anos vividos em Visconde de Mauá. "Moro em Mauá, mamãe me manda grana" foi mixado parte em Miami (as seis primeiras músicas) e parte em São Paulo (as cinco últimas).

Maestro Enrique Cubano - ou Enrique Andres Baradat Bosch, para os íntimos -, com seus óculos tipo aviador, camisa branca salpicada de flamingos, semelhante a que Tony Montana usa para se apresentar à tão sonhada América, não se acanha quando recebe a notícia de que não há troco para a nota de cinqüenta reais. Saca sete dólares da carteira e está tudo resolvido. O saquê, valor: doze reais, foi bebido à distância da esposa, Lucinda, brasileira. "Mi hijo, coloca esse negocito bem escondidito que se miña mulher me pegar bebendo, estoy fodido", pede com o sorriso de dentes branquíssimos abaixo do espesso bigode a Pedro Modercin, garçom do bar Pingo de Mel, um dos mais antigos de Maringá. (A região de Visconde de Mauá é formada por três vilas - a dita cuja, Maringá e Maromba. El Cubano mora na estrada em direção ao refúgio dos hippies e dos escritores fracassados, Maromba).

Quando chegou à "serra da fantasia" (faixa três do disco), com alguns dólares no bolso, um violão e uma novíssima esposa, trocou os pertences - menos Lucinda - por uma charrete e um cavalo chucro. Começava a temporada dos "Passeios Poéticos". Pedro, 22 anos divididos entre Mauá e o Rio de Janeiro, lembra: "Ele era a alegria das crianças. A gente pulava na charrete e ele saía cantando no português muchacho dele". A bem da verdade, o maestro não é exatamente o mestre da métrica na língua portuguesa. Mas em tempos de "Maria Joaquina de Amaral Pereira Góes / Você contribói para o meu viver", quem necessita de uma poética rigorosa? O parnasianismo está morto. El Cubano é um cronista, um João do Rio da vida mauense.

Na música que dá nome ao disco, ele homenageia Bebezão, figura conhecida na região por... Bem, a letra é auto-explicativa. "João acorda às onze horas / ele tem as condições / Com seus 38 anos / gosta de ficar à toa / Tem terrenos, carros, empregada e uma vida boa". O refrão é talhado sob medida para o hype moderninho (já se tornou a música predileta dos funcionários do Pingo de Mel): "Eu moro em Mauá / minha mãe me manda grana / Não gosto de trabalhar / Levo uma vida bacana / Eu moro em Mauá / minha mãe me grana / Sou filho de marajá / Levo uma vida bacana".

Depois de montar uma banda em São Paulo, os Pinheiros Voadores, ser professor de música no Rio de Janeiro e montar um coral de Vivaldi, renascimento espanhol e madrigais franceses em Mauá, Maestro Enrique só quer saber de sombra y tequila fresca. A charrete foi aposentada e o quintal de casa se transformou em restaurante e pousada. Antes de voltar para o refúgio, El Cubano faz questão de esclarecer: "Yo moro em Mauá, pero mi mamã não manda la grana".

conselho pra 2010

se eu pudesse dar um só conselho a vocês, meus grandes amigos, correndo o enorme risco de ser pedante e infrutífera, seria uma só: mandem tomar em seus respectivos cus quem merece.

no fatidíco dois mil e oito - a.k.a. o pior ano da minha vida -, trabalhei em uma redação no Centro, 27º andar, imensas janelas. todos os dias o pensamento sobre 'one day i'll fly away' era recorrente. o dono da epartição era mais um desses cariocas arrogantes com o nariz parte na terra parte no céu, e que me lascou alguns apelidos singelos como "mula". prevendo o futuro, disse que não "passaria de uma vendedora de sorvete na porta de um cinema em salvador".

um dia eu pesei as dívidas e achei melho resolver minhas pendengas com o banco do que aturar aquilo.

por isso, pratiquem bastante o vá tomar no cu. e feliz 2010.

domingo, 3 de janeiro de 2010

a vida em visconde de mauá

o principal mecânico chama-se Cristiano e é cópia fiel do ator João Miguel. passa metade do dia na oficina - sua especialização é o fusca - e metade na pousada que acabou de construir no quintal da mecânica. João, meu amigo, se você desconfia de um irmão adotivo, ele mora em Visconde de Mauá e é mecânico. se não, fica a dica.

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não há bancos na região. ou você leva dinheiro da civilização ou paga no débito (quando a antena está funcionando, o que dá uma média de dois pra um. dois dias não, um sim). já sem nenhum tostão na carteira, perguntei por que DEMÔNIOS não instalam um maldito de um caixa 24horas ou um BANCO ali. "eles dizem que têm medo de assalto na serra". que fique registrado: primeiro lugar no MUNDO onde um BANCO se recusa a ser instalado.

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visconde de mauá, a vila homônima e não a região (formada por V. de M., Maringá e Maromba), tem UM bairro (o lote dez) e QUATRO campos de futebol. QUATRO.

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não é mentira. o ônibus maromba-resende parou na porta da casa de uma senhora. ela colocou uma caixa com pertences variados - detergente, leite, feijão, etc - e recomendou: "é pro paulo, ali em penedo. vai cufé". uma hora depois, um menino de boné vermelho pára o ônibus. "minh'vó mandô alguma coisa?" "aqui". e o ônibus segue. assim como a vida.

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em maringá, os horários são assim: das 11h às 13h, das 18h às 23h. não são apenas restaurantes. são farmácias, pousadas, lojas, oficinas. perguntei ao dono de uma (são duas no total) farmácia o que aconteceria caso alguém enfartasse e precisasse de um remédio. "não trouxe da cidade por quê, uai? a gente não é pronto-socorro". taí. vou carregar pra vida: a gente não é pronto-socorro.
são cinco para as três e meu ônibus só sai dessa ROÇA às quinze para as cinco. CANSEI. cansei de internet lenta - melhor dizendo, INEXISTENTE -, desse sol de montanha DESGRAÇADO, desse rio gelado e das pessoas que dizem taRRRde.

CIVILIZAÇÃO, EU TE AMO.