terça-feira, 25 de setembro de 2007

Estou cansada.

Estou cansada de tudo. Estou cansada dessa faculdade imunda com pessoas imundas que te olham estranho porque você está com sono e está lendo Nelson Rodrigues. Estou cansada das minhas coxas grossas que, por mais que eu tente, nunca irão diminuir vinte centímetros. Estou cansada de estudar teorias sociológicas e filosóficas já refutadas por outros sociólogos e filósofos que, no fim de oitenta páginas, irão dizer: isto já não serve para o nosso mundo. Estou cansada de teóricos e acadêmicos tentando entender o mundo. Esta merda não é para ser entendida, porra. Ou se quiser entender, pule de cabeça, mas não no meu quintal. Estou cansada do meio acadêmico e seus professores pensantes achando que estão mudando a cabeça de alguém - vocês não estão mudando a cabeça de ninguém. Ninguém realmente presta atenção em uma teoria que já começa com a frase: "isto não serve para nós". Você usa um microondas quebrado? Eu não uso uma teoria furada. Estou cansada do homem do gás que há quarenta dias disse que vinha consertar a merda que fez e nunca vem. Estou cansada desses prodígios da PUC que crêem piamente que vão salvar o cinema nacional - como se este precisasse ser salvo, ainda mais por prodígios da PUC - e o último filme que viram foi A Noite, do Antonioni. Estou cansada desses cineclubes da PUC que em vez de se preocupar com o que está sendo feito hoje em dia, o que é palpável, discute a obra de um autor vietnamita que só fez cinco filmes e morreu quando uma bomba nuclear explodiu em sua cabeça (presumo). Não agüento mais aqueles imbecis fumando maconha na vila da PUC - sim, essa vila mesmo que você viu no Tropa de Elite -, ouvindo Chico Buarque e se achando intelectuais para cima (ou pra baixo, sei lá.) Ás vezes, acho que estou fazendo tudo errado. Em vez de trabalhar e estudar feito uma cabra para ser a melhor aluna da faculdade, eu deveria era ir pra praia. Viajar para Parati quando me desse na telha. Pegar a promoção da GOL de r$ 10 e ir pra Manaus. Ou pra puta que pariu. Dizer para a professora que minha mãe morreu. Viver, sabe? Não sei muito de que serve fazer matérias que o povo gosta e não ir pra Fernando de Noronha. Eu quero meu hype em viver. Porque, incrivelmente, dinheiro eu já tenho.

sábado, 22 de setembro de 2007

Toda nudez será castigada, Nelson Rodrigues.

HERCULANO (grave) - Uma pergunta. Você gosta de mim? Gostou de mim?

GENI (atônita) - Que palpite é esse?

HERCULANO - Geni, não é palpite. Quer responder?

GENI - Sujeito burro! (Mudando de tom trinca os dentes). Só de olhar você - e quando você aparece basta a sua presença - eu fico molhadinha!

HERCULANO (realmente chocado) - Oh, Geni! Por que é que você é tão direta, meu bem?

GENI (desesperada de desejo) - Vocês homens são bobos! Está pensando o que da mulher? A mulher pode ser séria, seja lá o que for. Mas tem sua tara por alguém. (Muda de tom) Olha as minhas mãos como estão geladas. Segura, vê. (Ofegante) Geladas!

HERCULANO (amargurado) - Amor não é isso!

GENI (furiosa) - Me diz então o que é o amor?

HERCULANO - Certas coisas, a mulher não diz, não deve dizer. Pode insinuar. Insinuar. Mas não deve dizer. Delicadeza é tudo na mulher.

GENI (na sua cólera contida) - Hoje tudo que é mulher diz puta que o pariu. Ah, de vez em quando, você me dá vontade, nem sei. Vontade de te quebrar a cara, palavra de honra. Desconfio que você gosta de apanhar. Há homens que gostam.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Jornalismo por um fio

Em Quase Famosos, o aspirante à jornalista William Miller é enviado pela Rolling Stone para cobrir a turnê da banda Stillwater. Durante as viagens, ele liga para seu editor resumindo o andamento da matéria. Tudo acontece pelo telefone – inclusive a sua contratação – e, por isso, quando a equipe da revista o vê pela primeira vez, um garoto de quinze anos com sua montanha de post-its, nos quais escreveu a reportagem, ele é demitido.
Este foi o exemplo encontrado por João Marcelo Erthal, 34 anos, solteiro e sem filhos, para ilustrar a sua rotina de trabalho: ele mora no Rio de Janeiro, e a revista Carta Capital, na qual é editor-repórter, fica em São Paulo. Não tem escritório. Sua conta de celular em agosto foi R$ 980. O telefone fixo: R$ 600. E isso porque ele ainda usa Skype.
A lembrança do filme não foi à toa: Erthal se diz frustrado porque nunca se dedicou à escrita de roteiros. Ele pensa por algum tempo e repete o desabafo feito por José Carlos Bardawil a Luciano Suassuna em sua entrevista-biografia: “Todo jornalista quer escrever. Quem diz que não está mentindo. Mas, o jornal consome todo o seu tempo”. E, apesar de ter saído do Jornal do Brasil – seu primeiro emprego e onde ficou dez anos -, ainda sente falta da redação de um jornal diário.
Falar destes dez anos não parece fácil para João Marcelo. Para falar do começo, sorri e arregaça as mangas, como se fosse falar de um velho conhecido: “Eu não sonhava em ser jornalista no JB. Fazia publicidade na Hélio Alonso e me apaixonei por uma menina que fazia jornalismo. Passei a gostar mais das aulas dela que das minhas. Na época da prova do estágio para o Jornal do Brasil, não pude fazer porque tinha sofrido um acidente de carro. Entrei depois, em uma dinâmica de grupo – e que ironia, me colocaram para trabalhar na Carro & Moto.” Mas, quando uma aluna pergunta o motivo de ter saído, pensa, gesticula muito e resume: “Estresse e falta de perspectiva”.
Durante o tempo que ficou no JB, era conhecido como o rei do trote. Ligava para os colegas como se fosse o chefe de redação, Ricardo Boechat (hoje, apresentador do "Jornal da Band", na TV Bandeirantes), e inventava pautas. Pedem para ele imitá-lo. Erthal fica vermelho, diz que não. Mas, acaba não resistindo. “Porque teve uma vez que – o Boechat fala assim, né? Apertando a orelha. Teve uma vez que a filha dele ligou, pedindo para ir à Teresópolis, e ele na redação, aquela pressão, segurando o telefone em uma mão e apertando a orelha com a outra. Não. Não. Não. Até que ele encheu o saco e disse, com aquela voz soturna do Boechat: ‘Só não seja estuprada’”.
Depois de sair de lá, enfrentou um dos pesadelos do carioca: mudar-se para São Paulo. O que mais gostava na cidade, diz, era ir para Congonhas e pegar o avião para o Rio. Lá, trabalhou na Celulóide, agência de conteúdo – uma empresa que procura formas de aproximação de uma marca com as pessoas, como a Revista Oi. Para ele, foi interessante ver o outro lado do jornal: o da publicidade: “Existe essa separação entre Igreja e Estado, jornalismo e publicidade, e na Celulóide pude entender melhor o processo: é muito dinheiro envolvido, os detalhes são enormes.”
Com a experiência de empresário de comunicação, nasceu o Av. Central: um jornal mensal e gratuito com matérias de cultura, que foi criado junto com os jornalistas Ulisses Mattos, Bruno Sansone e Carlos Braga. Apesar de não ter dado nenhum lucro, ele acha que o Avenida foi bem sucedido: teve uma independência editorial e financeira.
Erthal olha para os lados, esfrega as mãos – teria mais alguma coisa para dizer? “Vocês não vão conseguir escrever um perfil sobre mim só com isso. Tem que perguntar mais”, diz para a sala. Um aluno pergunta se há pressão na Carta Capital para escrever determinado tipo de matéria. Ele diz que não, que há total liberdade de pauta dentro da revista – mas, sempre seguindo a linha editorial da Carta: “Tudo vira conflito rico versus pobre, tudo tem que ter por trás o peso das oligarquias, ou seja, é uma liberdade vigiada”. Mas, João Marcelo, você apóia incondicionalmente o governo Lula, como faz sua revista? “Lula foi muito importante para o país. Mas, eu, classe média, estou perdendo muito com ele. No fim, eu acho que a imprensa deve ser clara”.
E se William Miller precisava procurar debaixo dos colchões as moedas para ligar para a redação, este não é o problema de Erthal: a Carta o reembolsa pelas suas contas de telefone.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Eu queria ser artista plástica. Queria saber pintar um quadro com todas as cores do seu rosto. Cada músculo que se mexe são novas cores surgindo e que formam novas formas e imagens - e elas vão se dissolvendo pelo quarto, se esfregando nas paredes - você se esfregou em mim, e agora tenho seu cheiro. Teu cheiro empesteado pela casa, pelo meu queixo, pelo meu sofá - teu cheiro guardado na minha blusa, que eu joguei ali na gaveta. Você sempre vai embora e deixa tudo bagunçado: a cama continua feita - esta tua mania perfeccionista de não tirar nada do lugar -, e ainda assim, tem alguma coisa diferente. Tudo está diferente. É o seu cheiro que impregnou as paredes pintadas de cinema da minha casa. Engraçado que a última vez que você veio não tinha o Antonioni ainda. E você parado ficou, olhando. Parecia que iria engolir o pôster de Blow-Up. Não sei pintar. Não sei falar. Milhares de coisas passavam pela minha cabeça, mas nada ficava: passou canção, passou show, passou programa, passou livro, passou fulano, passou amor, e nada ficou. Só escutei. Escutaria para o fim da vida. Não sei responder às suas perguntas. Sou burra. Fico burra. Esqueço de tudo. Minto que sei. Digo que esqueci. Só para te escutar mais um pouco - só mais um pouco, mas falta tão pouco para você ir.

E, no fim de tudo, eu volto a ficar sozinha. Me escondo nos cobertores que é para não sentir a sensação do seu cheiro indo embora aos poucos. Agarro-me aos pincéis que ainda não tenho para desenhar no meu ar, teu rosto e apenas ele. Com todas as cores. Com todas as formas.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

apenas uma quarta-feira.

Eu agora sou jornalista. De carteira assinada e as porra. E vendo uma palestra do Marcos Prado, o diretor de Estamira e sócio do José Padilha, cada vez mais eu me convenço que documentário é que me dá tesão. Construir personagens, mundos e estórias é um exercício prazeroso; muito mais prazeroso, porém, é descobrir as histórias que existem por aí, enterradas na puta que pariu, pedindo para serem contadas. As pessoas querem falar. O que elas mais querem é falar. Só basta alguém ter um mini-dv e paciência. O que eu tenho.

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A Barra é o lugar do "muito". As pessoas são muito bronzeadas e muito loiras, é tudo muito caro ou muito barato (uma água na padaria custa r$ 3,50, mas o chopp na praia custa r$ 2,30), tem muito carro, venta-se muito, as academias de ginástica são muito grandes e os prédios são muito estranhos. A arquitetura do bairro é esquisitíssima: durante a praia, você pensa estar em uma cidade nordestina ao estilo de João Pessoa. Calçadas pequenas, arborizadas de 5 em 5m, barraquinhas na praia, com pedrinhas irritantes, e pessoas com cara de babaca passeando com seus bonézinhos. A Barra é nordestina e não sabe. A Barra veio de pau-de-arara e não sabe.

Tentando se distanciar da classuda Zona Sul, a Barra investiu em arquitetura moderna: nenhum prédio pode ser igual ao outro e muito menos igual a qualquer construção já imaginada por um ser humano dantes. O Hotel Sheraton, na minha visão do ônibus, me pareceu um bando de lata de sardinhas amontoadas no supermercado, cuja maior vontade é tirar uma e sair correndo para ver o resto desabar. Ao lado dele, se tem um condomínio não menos bizarro: uma coluna, chão, uma coluna. Seria um L? Um H? Um T? Um sinal alienígena? Nada. É moderno. É barrense.

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Não sei o que esperar indo a Salvador. Sempre tenho medo de voltar lá; a sensação de que alguma merda vai cair sobre a minha cabeça, me soterrar e eu nunca mais sairei dali é grande.
Ás vezes, eu penso que sou um pouco Tieta, que volta para o sertão apenas para mostrar que é gostosa, que é fodona e termina odiada pela cidade inteira.

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Renan Calheiros foi absolvido?
Não vou entrar no 'já sabia'. Nem no 'puta que pariu, esse país é uma merda'. É uma sensação de vodka barata. Só que constante.

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Não sei amar.
A única coisa que aprendi.

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

reflexões de feriado

Dr. Freud diz que quando a gente não libera nossas pulsões - não fode, não arruma a casa, não faz porra nenhuma - o ego encontra outra forma de liberar estas pulsões: se auto criticando, por exemplo. É um prazer para o ego você comer até explodir e depois ficar querendo se assassinar por ser uma baleia orca cujo estômago dilátavel acabou de engolir o restaurante inteiro.





Foda-se Dr. Freud.

domingo, 2 de setembro de 2007

quatro de setembro de dois mil e um.

-E a Beatriz, seu Paulo?

-Ah, essa era boa de comer. Gostava de trepar, sabe?

-Hum.

-Era uma cachorra. Chegava em casa, tirava a roupa e queria que eu comesse ela em todos os cantos da casa, era uma louca. Saía de casa como cabelo todo amassado, esmaranhado, os fios pra cima, e não tava nem aí. Continuava gostosa do mesmo jeito.

-Mas foi ela quem destruiu seu casamento, não foi?

-Ela destruiu minha vida, menino. Deixe eu te dizer uma coisa: nunca confie em mulher que gosta de pau. É a desgraça do homem. A gente tá acostumado a comer a mesma buceta de sempre, a senhora nossa esposa que deus escolheu pra gente - e de repente chega essa louca querendo gozar até dizer chega. Fiquei completamente enrabado por ela.

-Mas não tinha sentimento, seu Paulo? Era uma coisa só sexual?

-Claro que tinha. Mas o sentimento surgiu depois, menino. Nela, eu digo. Quer dizer, não sei.

-Mas, como assim, ela acabou com a sua vida?

-Fodeu, meu filho, fodeu a minha vida. Não fui mais o mesmo depois que eu conheci aquela mulher, aliás eu nem sei quem eu sou.

-Você tinha 35 anos quando a conheceu. E ela?

-16.

-O senhor não teve medo de ir preso?

-Por um tempo eu tive - e te digo que resisti por quase dois anos. Teve uma hora que não deu. Mas confesso que quando ela fez dezoito anos eu respirei aliviado.

-E como foi que a Beatriz surgiu na sua vida?

-Eu sempre gostei muito de música e tinha uma coleção de vinis que era conhecida no bairro. Os meninos sempre iam lá ouvir música enquanto eu tava na loja, ganhando meu pão de cada dia. Até que um dia ela apareceu. Nunca tinha visto na vida. Cheia de vergonha, com as bochechas vermelhas, segurando as mãos, querendo ouvir um vinil dos Chico Buarque. Achei até estranho, uma menina daquela idade querendo ouvir um vinil do Chico - mas você sabe como é, o velho tava na moda na época. Eu me peguei ali, olhando para aquele shortinho agarrado, preso, tentando me concentrar - mas não fiz nada, né, porra, tinha uma loja pra cuidar, a menina podia ser minha filha, minha mulher tava fazendo o jantar, caralho - eu pensava comigo mesmo.