sábado, 30 de maio de 2009

na madrugada, dois bilhetes de loteria sem serventia alguma. quando era criança, toda segunda e toda sexta era dia de loteria; uma única vez minha mãe me deixou preencher os números; eu era criança boba e copiei os números vencedores da semana passada. dona heliana brigou comigo, rasgo a aposta e disse que nunca mais eu teria direito a apostar em nada. a única vez em que ela ganhou foi uma quadra, que pagou uns duzentos reais. uma noite, depois da padaria, ela me perguntou "por que você acha que eu nunca vou acertar a sena na vida"? a voz engasgou, não saiu palavra por palavra e eu fingi que não ouvi. mas queria ter dito: coisas boas não acontecem com a gente de graça.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

... poucas pessoas sabem que há um caminho, atrás do museu de arte moderna, que leva diretamente à pista do aeroporto. veja bem: não é ao aeroporto, mas à pista. nunca tinha visto uma tão de perto; uma toalha imensa, xadrez vermelho-e-branco, sobre um chão liso, tão liso, nossa, como é bom andar de bicicleta naquele tapete negro. existem códigos secretos também, regras que valem uma vida - se a luz vermelha acender, é hora de sair correndo; o aeroporto fica à beira do mar, e um vendaval... deitar na pista, avistá-lo enorme, chegando dos céus, sair correndo antes do portão fechar - sim, sim, sempre...

terça-feira, 26 de maio de 2009

cara

hoje vi uma avó
- minha, sua, de qualquer um
em uma scooter amarela
e ela tão livre
e tão bela
e tão solta em laranjeiras
que pensei:
"quem dera!
um dia ser assim..."

domingo, 24 de maio de 2009

... e quando raia o domingo, desses de farta quentura, vapor erguendo-se do asfalto, mal balançam as árvores e como ficam lindas, lindas as meninas nas bicicletas, sim, então surgem as nossas tardes lentas, agora já perdidas, eu cá, você lá, mas persistentes nesses domingos, onde a hora não se dava, as flores não se partiam, as pessoas ficavam - éramos todos, no fundo, uns agregados - e entravam tarde, noite, luzes adentro. não estávamos por um fio; sequer conhecíamos a água suja da angústia, tínhamos lá, claro, nossas pequenas distrações, porque uma vida plena de felicidade é falta de significado, mas ainda caía uma certa chuva de primavera, antes das flores abrirem e de todo, todo o resto desagüar.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

a pior semana do mundo

não foi a pior semana da minha vida mas estava no top 5. (chegou muito perto de derrubar a seqüência de dias em que minha mãe estava no hospital na segunda, ia morrer em uma semana na terça, em 24 horas na quarta, na quinta meu pai já havia arranjado tudo para eu me mudar para a casa dele e na sexta ela deu sinais de vida, mas aí que essa semana tudo começou a se resolver na quinta, então vejamos).

segunda: quando seus pés pisam o chão frio de madeira de laranjeiras numa segunda às 5h30, e decidem voltar na mesma hora, você treme: vai dar merda. a pessoa que iria montar meu filme, o onipresente 569, me entregou uma colagem rameira e mal-feita de seqüências sem sentido algum. nem se godard tivesse tomado um ácido para ver meu filme aquilo teria dado certo. também foi o primeiro dia no emprego novo: além de ter eu ter que passar pela rocinha todos os dias (not nice, not nice, not nice), logo no primeiro dia eu recebo um catatau de 300 páginas para ler. e minha gente, eu choro. choro de desespero.

terça: a matéria sobre tecido acrobático degringola e um novo tema surge: o ano da astronomia. pode ser interessante, mas no mundo da televisão, uma coisa é essencial: autorização de cessão de imagens. e a responsabilidade de conseguir isso é minha. mesmo eu tendo dois empregos, duas faculdades, dois filmes, dois roteiros para terminar... não consegui um lugar para editar o 569. cancelei a gravação de duas irmãs (o nome do próximo, aliás) e desisti de ser cineasta. é muito difícil. ninguém te ajuda. descubro que meu curso, pelo qual paguei 500 reais, é no horário do trabalho. não há reembolso. devo pedir demissão?

quarta: o CLÍMAX. além do curso, a puc fez o favor de marcar palestras e trabalhos também no horário do meu trabalho. that's it, vou pedir demissão. consegui uma ilha de edição. à noite. e no sábado, de 7h às 19h. chantageei, menti, traí. mas consegui a ilha. problema: eu saio de s. conrado, que é do outro lado do rio de janeiro para copacabana, que é O INFERNO do rio de janeiro, para dar aula. e eu preciso fazer o translado em 10 minutos. não consigo, claro. para completar, o motorista me deixa no ponto errado. e eu estou de salto. e assisto a um seqüestro-relâmpago na orla. e pego o ônibus errado para ir para a casa da aluna e ainda tomo esporro do cobrador (eu sou cobrador, como é que a senhora espera que eu saiba contar?). na saída do ônibus, o salto emperra e a professora cai em cima dos mendigos. de copacabana. transtornada, a pessoa já descabelada cai em um choro torrencial e é socorrida pelos IDOSOS do bairro, que a levantam, a ajeitam e a levam ao endereço certo.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

e última coisa, essa para desabafar mesmo.

eu me sinto, de todas as formas, ofendida quando me dizem que eu não posso fumar na rua. a rua é espaço público desde sempre. e não me venha com essa balela de fumante passivo - isso foi uma justificativa que o governo te vendeu e você comprou. porque obviamente, em cinqüenta e três anos de vida, o seu primo morreu de câncer exclusivamente porque trabalhava oito horas por dia ao lado de um cara que fumava. tenho um recado para você: respirar, esse ato tão necessário, libera radicais livres através de gás carbônico que podem gerar células cancerígenas.

fumar virou motivo de vergonha; o meu prazer agora não é nem risco de vida, é risco de prisão. porque eu não tenho dinheiro pra pagar a multa. acho que são 600 reais, não é? 600 reais eu gasto em coisa bem melhor.
eu sou apaixonada pelo rio de janeiro. o rio, para mim, é essa puta velha, com os dentes todos careados, mas que insiste em pôr botox, pintar a raiz de loiro e sair pra night. acho as histórias dessa puta divertídissimas - e ainda vejo muita beleza em seus olhso verdes. mas talvez seja apenas eu.

o meio acadêmico - inclua aí não apenas a universidade em si, mas os teóricos que saem da academia e continuam escrevendo como se ainda estivessem - insistem nessa idéia de cidade partida. ora, estamos todos nesse mesmo barco furado. o professor da renomada faculdade particular no fim de semana vira vendedor de maconha e é assaltado do mesmo jeito. como qualquer um. o transporte público é uma merda para todos os lados - claro que se você tem um carro, parabéns, sua vida é ótima. a minha não. nem dinheiro pra táxi eu tenho. há dias em que eu pego seis ônibus. e ando feito uma infeliz.

você não está seguro em lugar nenhum. nem dentro de casa. sei lá, vai que seu vizinho é um psicopata e ninguém sabe (agora, o mundo criou essa onda onde todo mundo é socio ou psicopata). mas as pessoas insistem em ainda dividir, delimitar as zonas. não adianta. a cidade não é estática. as pessoas não são estáticas.

terça-feira, 12 de maio de 2009

se for pela lua ou pela arrumação dos planetas, se for pela necessidade de coragem latente, se for pela falta de coragem entrecoberta - o fato é: o que me resta é muito.

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sobre terem comparado o eduardo paes ao giuliani de nova york: os assaltantes, as putas, os travestis, os traficantes, os meninos de rua - todos continuam por aí. agora, quem estaciona carro na calçada paga multa. e cara.

***

no fim de maio gravo meu segundo filme.
hoje foi dia de faxina. joguei sete sacos de lixo apenas de papel. peguei o computador na oficina. reorganizei papéis e documentos. encarar o passado me fez pensar, por cinco minutos, na pessoa que eu sou hoje.

daí joguei o lixo fora, que hoje é dia de reciclável, e MOVE ON.

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eu ando com tanta raiva da minha vida e isso não é, necessariamente, algo ruim. raiva do medo, da imbecilidade, e mais ainda, da lentidão que eu trago injetada nas veias.