quinta-feira, 30 de outubro de 2008

todos os dias, todos os dias: nasci na época errada.

(tempo onde se diz que diana krall é jazz, em caixa alta)

(quando fumante é visto como pária)

cansei.

me deixem voltar para 1910.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Morri de você. Não de cianureto nem de pneumonia. De você.

Depois levantei da cama, bati a cinza do cigarro.

Um café forte para aqueles que ficam.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

escrevo para corromper
meu sorriso
puído, gasto
desses dias
de sol forte.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

"Vocês não acreditam que eu seja um escritor?"

"Não temos nenhum modo de comprovar isso".

"Mas vou perder meu trem. Ele está para sair a qualquer momento".

"Meu caro amigo..." Revirei minha mochila e de repente encontrei um artigo em uma revista sobre Henry Miller e eu e o exibi para o cara da alfândega. Ele sorriu:

"Henry Miller? Isso é ainda mais notável. Ele foi detido por nós há alguns anos, escreveu um monte de coisas sobre New Haven." (Esse era um New Haven bem mais sinistro do que aquele em Conneticut, com sua fumaça de carvão ao nascer do dia). Mas o cara da alfândega ficou imensamente satisfeito, checou meu nome mais uma vez, no artigo e nos meus documentos, e disse: "Bem, temo que agora serão apenas sorrisos e apertos de mão. Lamento muito o ocorrido. Acho que podemos deixá-lo passar - com a recomendação de que deixe a Inglaterra dentro de um mês".

(Kerouac)
por que não posso ser como kerouac e london, henry miller, que viveram como quiseram, por onde quiseram? sou mulher, brasileira, em doismileoito, ninguém vai me aceitar como lavadora de prato em navio cargueiro indo pro marrocos. vão pensar que carrego uma bomba. cansei desses lugares, hábitos, pessoas. cansei de jornalismo - é patético como as pessoas tratam a vida das outras pessoas. sair daqui, áfrica, índica, que vontade de tudo, que vontade do mundo. a vida nos livros é tão, mas tão mais interessante que a minha, ainda que a minha vida seja maravilhosa e recheada daqueles pequenos medos que nos fazem saltar prédios. eu quero conhecer a cor de outros céus, como se amanhece no alasca, a que horas se dorme na martinica, qual o som do mar na índia. e quem disse que é tudo a mesma coisa, goza, infelizmente, de uma atroz burrice. eu sei que é necessário paciência, mas como se pede isso a alguém de vinte anos? sinto sempre que estou atrás do mundo. gostaria de ter uma bela frase para compensar esse sentimento, mas a realidade me convidou para tomar um trago ali na esquina.

domingo, 19 de outubro de 2008

se você é um escritor, nunca, nunca, nunca trabalhe com algo em que tenha de escrever.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

eu não esperava isso, não de você. mas agora é levantar os olhos e ir em frente, por cima de toda a merda, de toda a lama, de todo o tempo gasto em vão. acordar sã é mais importante, ainda que eu duvide disso por alguns dias; meu filme é tudo. e você é nada. culpa? inteiramente sua. guarde-a, cuide com carinho. cada um com seus demônios.


I was drowned, I was washed up and left for dead.
I fell down to my feet and I saw they bled.
I frowned at the crumbs of a crust of bread.
I was crowned with a spike right thru my head.
But it's all right now, in fact, it's a gas!
But it's all right, I'm Jumpin' Jack Flash

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

estamos preparados para qualquer coisa. o fato desse poder ficar incubado boa parte do ano, pelo menos para mim, não significa que ele desapareceu.




mas ninguém nunca disse que não doía.
nota mental: nunca, nunca, nunca mais na vida chegar perto de uma máquina fotográfica.

domingo, 12 de outubro de 2008

cidade de deus me ensinou a montar filmes.

woody allen me mostrou a força dos diálogos.

scorsese me deu estilo.

hitchock me concedeu a máxima: mostre tudo sem revelar nada.

truffaut depositou em mim a delicadeza.

tarantino, a agilidade.

fellini compartilhou comigo sua doce ironia.

wilder, sua inocência sarcástica.

de bergman, fiquei com a profundidade.


e agora para juntar tudo isso em um roteiro só? 150 páginas à prova.

socorro.
sem saber o que fazer com tamanha liberdade e sem qualquer seta para indicar-lhe o caminho, meteu os pés pelas mãos, enfiou-se em um buraco e há quem diga que derramou uma lágrima.

dias depois, todavia, ao se ver com todo o mundo à disposição e um relógio que, finalmente, andava a seu favor, decidiu sair de casa.

e andar de bicicleta.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

R$ 55 para o Rio de Janeiro. Há quanto tempo mesmo? Lavínia não lembra. Ela não tira fotos.

Sentar e esperar por uma hora não é uma boa opção. Com o troco, dá pra comprar um pão-de-queijo, café e biscoito para a viagem. A rodoviária do Tietê é grande o suficiente para atiçar a curiosidade de Lavínia, com suas botas altíssimas marrons e um vestido preto incompleto; tanto por revelar a tatuagem no braço esquerdo e o trecho de carna à espreita do vestido, quanto por atentar com a falta de. Braço.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

as coisas vão acontecendo, e eu só percebi que já tinha ido quando cheguei em outro aeroporto e não o reconheci:

-onde estão as cadeiras azuis?

A mala apoiou-se no chão da rodoviária. Ela estava sem dinheiro para um avião, mas veja só, quando entrou no metrô da Paulista rumo à estação Tietê poderia jurar de pés juntos que teria a alegre companhia de uma aeromoça servindo sucos light e cerveja preta.

Nunca havia estado em rodoviária tão grande. Ou já? O aeroporto de Vitória é claustrofóbico. Dezenas de executivos de sotaque estranho às seis da manhã entupindo-se de pó e café, disputando a palmo os azuis assentos, enquanto um homem careca tenta organizar quatro filas ao mesmo tempo em que impede com dois finos braços que as pessoas corram desesperadas em direção à pista.

Lavínia tinha R$65,48 na conta bancária. Para onde fosse, não iria ser mais longe que aquilo - sua distância máxima estava calculada em R$65,48 e a qualquer momento o banco poderia cobrar os juros do cheque especial. Não queria passar pela vergonha de explicar a situação ao vendedor - vai saber se ele me engana.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

ah, que você prometeu o mundo como uma brincadeira, quando ela disse 'não, não vem que não tem, não acredito em promessas', e desse monte de nãos, você fez uma poesia, muito bonita inclusive e até, mas com esses versos brancos e sem rima, obviamente que não daria certo. desde o início as antenas da cidade captavam que essa amizade não iria durar muito, os radialistas comentaram em seus programas às seis da manhã, em meio a notícia de alta de trigo e o trânsito na cidade. enquanto isso o foguete dispara, e o mundo ri, como sempre, sambando mais uma vez, certo que escreveu todas as páginas corretamente, e com aquele olhar de quem sabia, há muito, do fracasso desses idiotas, os homens.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Fiquei quinze minutos procurando as chaves na bolsa. O porteiro me encarava com um pacote de cartas na mão. Filho da puta. Não podia levantar a bunda da cadeira cinco minutos. Finalmente achei as duas chaves. Bolsa de mulher é realmente um problema, ele disse, quando me entregou as contas. Uma atrasada, de quinze dias. Outra para pagar, dali a quinze dias. Assim que virei a maçaneta, um gato tentou fugir em direção à luz – a lâmpada da sala queimou e eu ainda não tive saco de trocar. Tempo. A ração deles tinha acabado, era hora de fazer tudo novamente: colocar a chave na bolsa, trancar a chave de casa, descer os três andares de escada para não me sentir uma completa sedentária, bater a porta da rua. O mercado estava, como sempre, insuportável. O casal da frente comprava duas coca-colas de três litros. O que vão fazer com tanto xarope, meu deus? Uma orgia de cafeína e cola? Beber coca-cola até perder a visão e ficar rodando no mesmo eixo? A menina das bochechas rosadas de espinhas e cabelo mal pintado de loiro comprou um saco de pão-de-queijo, duas dessas coisas geladas de chocolate, e pó para fazer chá. Eu estava na fila com um saco enorme e estapafúrdio de ração rosa, desejando ardentemente umas jujubas ao lado do caixa, e algumas pilhas. Mas sem dinheiro. Voltando pra casa, ainda pensei em comprar uma caixa de chocolates, uma grande caixa de chocolates brancos para entupirem minha boca, exatamente como uma rolha, e evitarem o vexame de um inadequado grito no meio da rua. Mas eu precisava. Gritar. E não queria gritar na minha casa, poderia assustar os vizinhos, e muitas vezes eu preciso deles, especialmente quando esqueço as minhas chaves de madrugada. O meu objetivo, nessa noite, era apenas um: dormir. Irrestritamente. Começar às oito da noite e terminar oito da manhã, já que na sexta-feira eu posso me dar ao luxo de dormir até mais tarde – o horário da faculdade deixa. Então, depois de chegar em casa pela segunda vez, tranquei a porta duas vezes e me joguei na cama. O telefone tocou. Era minha mãe. Infelizmente esqueci de tirar o cabo da linha, e o barulho do aparelho me cria uma culpa de ser um acidente mundial e apenas eu não estar sabendo. Saia de casa, precisamos de você nesse mesmo minuto. E eu dormindo. E ouvindo tudo isso. Depois que eu atendi, e a minha mãe reconheceu a minha voz, não havia mais muita a coisa a se fazer – ela queria conversar sobre meu tio, arquiteto sem talento para ganhar dinheiro, que estava se separando de uma psicótica mas que sustentava a casa. E que ele tinha pedido dez mil pra ela. Eu não tenho coragem de pedir quinhentos a ela. Não que ela seja pobre, mas são princípios. Não se pede dinheiro a mãe depois que se sai de casa. Nem que se esteja passando fome. Não dá. Depois o cara me ligou para falar de um emprego, e eu tô aceitando qualquer coisa, absolutamente qualquer coisa. Durante a tarde eu ensaio as frases chaves para mandar meu chefe à merda e eventualmente quebrar alguma coisa na saída. Ah, como é confortável ser covarde e receber o tradicional café na xícara vermelha às cinco da tarde, e depois o contra-cheque depositado na conta todo mês, na data certa. A covardia é o meu bem maior, é a minha toalha branca pendurada nesse banheiro sujo e coberto de jornal. Não há qualquer orgulho nisso, há pena e um certo lápis de olho. Toda a questão está desenvolvida em dois pontos: eu quero viajar. E não tenho dinheiro. O telefone tocou de novo. Uma gravação infeliz acerca da conta não paga de quinze dias atrás. Tentei mandar à merda mas ela não escutou. Acho melhor descer, tomar uma cerveja. Vou fazer isso.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008


with a little help from my friends.
ali, no meio da Paulista de luzes estranhas e casacos enormes, além de longos pints, ele confessou ter medo da cidade grande, sentir saudade de casa, ter perdido cinqüenta reais em uma hora com cerveja e batata frita, não ter gostado da maconha de são paulo, querer fazer um dragão nas costas, ter muita, mas muita preguiça de trabalhar.

ela estava com frio, mas não quis dizer, queria acender um cigarro, mas eles ficaram no rio, para onde não queria voltar, mas tampouco queria ficar se fosse para dormir ali; sentiu uma enorme simpatia por dois indianos que atravessavam a rua no mesmo sinal e quis encontrar aquele pessoal que grafita virtualmente os prédios. para poder brincar também.

mas então que o ônibus chegou e ficou só o amargor na boca.