domingo, 8 de junho de 2008

CENA 1

(Escuro. A luz aparece lentamente, revelando duas mesas e um balcão de bar. Em uma delas, à esquerda, estão sentados dois homens: o primeiro mais velho e o segundo, um tanto garoto. Na mesa seguinte, uma mulher está deitada em cima do braço. Benny está limpando o balcão, com sono e um tanto mal-humorado. Ouve-se um jazz muito baixo).

DAVIS: Não se faz mais música como antigamente.

BLAKEY: O que você está dizendo? Que música?

DAVIS: Essa música. Não está ouvindo? Olha esse piano... Ninguém mais toca o piano. Virou peça de museu.

BLAKEY: Benny! Aumenta a música.

BENNY: (ainda limpando o balcão) Não dá, Blakey. A noite tá acabando, e além disso, a moça aqui está dormindo.

BLAKEY: Moça? Que moça?

DAVIS: Atrás de você.

BLAKEY: O que ela está fazendo aqui essa hora, Benny? Não apareceu ninguém para levá-la em casa?

BENNY: Chegou sozinha, a noite inteira bebeu sozinha, sozinha dormiu na mesa.

DAVIS: Há algo de muito estranho no mundo quando uma mulher dorme sozinha em um bar.

BLAKEY: Você não acha melhor acordá-la, Benny?

DAVIS: Daqui a pouco, isso aqui fecha. Vai deixar a moça sozinha aqui?

BENNY: Não sei ainda.

BLAKEY: Você pode deixá-la dormir... Se ela acordar, ela te chama. (ironicamente) Você não vai a lugar algum, não é, Benny?

BENNY: A minha vida não é de sua conta, Blakey.

DAVIS: Calma, Benny. O garoto só deu uma sugestão.

BENNY: O seu gosto para garotos sempre foi péssimo, Davis. Bêbados e arrogantes.

DAVIS: São os mais fáceis, meu querido Benny. Os mais fáceis.

(Mulher levanta a cabeça)

SONIA: Onde estou?

BLAKEY: (vira-se) O dono disso é aquele ali, ó.

BENNY: A senhora quer uma água?

SONIA (um pouco assustada): Não, não... Tenho que ir, voltar, antes que o dia amanheça. (tenta levantar da cadeira, mas não consegue)

BENNY: A senhora bebeu muito, a água vai melhorar.

(Benny sai)

BLAKEY: Você não tem marido?

DAVIS: Blakey, comporte-se.

SONIA: Eu... Não... Quer dizer, tinha.

BLAKEY: Tem ou tinha?

DAVIS: Blakey, deixe a mulher em paz!

SONIA: (falando sozinha) Tinha, tenho... Não sei... (começa a chorar)

(Benny volta com a água)

BENNY: Sua água.

(Sonia empurra o copo)

SONIA: Não, nada... Nada vai me fazer melhor. (Benny volta a limpar o balcão)

BLAKEY: Teu marido te abandonou, foi?

DAVIS: A senhora não precisa responder se não quiser.

SONIA: (explode) Eu tive que matá-lo!

(As luzes se apagam)