terça-feira, 15 de abril de 2008

A mão, mesmo tremendo, consegue deslizar pelos cabelos ruivos. Ruivos não, acobreados. Segura um punhado de fios, lisos como os da mãe. Já foram pretos, loiros, e hoje são assim – cor de barro, árido. Desistiu de dormi, o sono virá com o caminhar das aulas; no primeiro dia sempre fica assim, irrequieta, pensativa. Dava tudo para saber o que se passa em cada olhar daqueles meninos, cinqüenta olhares diferentes, inquisidores. Eles não sabem – ela também julga. Cada um deles, com lábios ágeis, cheios de vida e fúria. Meus olhos já foram assim. A professora. A professora tem o poder. A professora é maior que qualquer um ali e pode passar por cima de qualquer garotinho intrometido. Uma vez fez isso. Que horror, Leandra! Sim, abuso de poder. Não, que coisa feia. Não condiz com suas atitudes normais. A dez metros, Luís ronca; a samba-canção cinza o fagocita – nada mais daquela pele bronzeada, aqueles ossos cobertos de pêlo, nem força masculina Luís possuía mais. Em um passado distante – solidificado em fotos kodak -, quando eram jovens, atores nas terças e quintas à noite, e seres humanos normais no resto dos dias, famintos de desejo, ávidos por descobrirem-se, ah!, ali, sim, funcionava. Eram vários. Uma noite, Leandra era uma princesa tropicalista, e ele o Romeu de bata; na peça seguinte, era Medéia. Luís era mais homem, era homem inteiro. Foi tudo pelos ares.