sexta-feira, 2 de abril de 2010

bukowski, 2003

o primeiro livro que caiu nas minhas mãos do velho hank foi misto-quente. vinha naquelas recomendações da l&pm, 'se você comprou esse livro, leia esse", na contra-capa do on the road, do kerouac. misto-quente, sem exageros nem parafernálias, mudou a minha vida. o jeito como escrevia, como o mundo se apresentava aos meus olhos, como o álcool poderia e deveria ser um antídoto ao inferno cotidiano, da libertação necessária e sofrida. bukowski falava - e ainda fala e sempre falará - ao meu coração: little girl, with freedom comes, inevitably, solitude and guilt. e eu entendi. e eu pratico. e eu escrevo.

e eis que uma das pessoas que eu mais amo no mundo - e que sequer leu uma linha do grande hank - me entrega essa, essa, essa. (sorry, não há um adjetivo completo). esse filme chamado bukowski - born into this, que começa com hank em mais um dos seus recitais pelos estados unidos, bêbado, reclamando por mais vinho, lá pelo fim dos anos setenta (ali na época de factótum).

motherfucker. a sensação de ter percorrido tantas vezes aquelas linhas sujas, perfurantes, tones and tones and tones of suffer, love and pain, e assistir ao hank VIVENDO aquilo. escrevendo. na sua velha máquina de escrever, no quarto sujo em san diego, tijuana, los angeles. hank dirigindo pela califórnia enquanto um dos poemas mais LINDOS do mundo se revela, em P & B:

there are worse things than
being alone
but it often takes decades
to realize this
and most often
when you do
it's too late
and there's nothing worse
than
too late.


(eu queria ter escrito isso. como eu queria ter escrito isso. mas meu coração se acalma ao saber que foi hank, o velho hank, meu amigo de vinho barato hank, quem escreveu.)

e o filme percorre toda a vida dele: a infância fodida com aquela merda daqueles pais (a quem ele sempre voltava), os dois anos de faculdade em que ele nunca assistiu a uma aula por completo, as mudanças de endereço pelos estados unidos, as CORRIDAS DE CAVALO, as mulheres, os traumas, os traumas, os traumas. a fama.

e em tudo se respira hank, o nosso hank bêbado, sentimentalóide, que odiava os hippies / beatniks / radicais de qualquer tipo, que chora ao ler a página de factótum em que ele descreve o banho de banheira que ele e linda tomaram. o hank que expulsa linda a chutes do sofá porque bebeu demais, é ciumento demais, inseguro demais e sente culpa demais.

é um filme do caralho. cada crédito foi minuciosamente pensado e detalhado. cada corte foi feito ao estilo de hank: seco, preciso, direto. cada inserção de música está contida em algum livro dele.

para hank, só o meu amor. para esse filho da puta que dirigiu essa preciosidade, só o meu amor. para quem me emprestou esse filme, só o meu amor.