lembro de minha mãe, muito menina, com sonhos de ser grande e invadir o terreno do vizinho com notícias do mundo de lá; os olhos bem pretos espiando atrás da porta o que existia além da maçaneta e construindo pilhas de diários para serem derrubadas no momento em que a vida real subisse por seus vestidos de algodão puro - heliana nunca gostou de seda. lembro dela, docemente terrena, descendo as escadas com uma saia xadrez até os joelhos - estamos em 1968 - e a blusa de gola rolê vermelha com um desabrigado botão, encontrando olhares vãos até abandonar os seus nas luas de um castanho português. lembro dela dizendo, sem pudor do patético, que havia montado o seu ninho - o mundo que esperasse do lado de fora e fosse viver seus problemas & pagar suas taxas de incêndio.